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Rulfo vai ao cinema com parábolas sobre riqueza e fome
JOSÉ GERALDO COUTO
da Equipe de Articulistas
Toda a obra literária do mexicano Juan Rulfo
(1918-86) -a
coletânea de
contos "O Planalto em Chamas" e o romance "Pedro Páramo"- cabe num livro de menos de 300 páginas.
No entanto, poucos escritores do
continente foram tão influentes
quanto Rulfo, que retratou o universo calcinado dos camponeses
mexicanos numa linguagem próxima ao mesmo tempo da concisão
de um Graciliano Ramos e da complexidade de vozes e tempos narrativos de um Faulkner.
Tão poderosas são essas poucas
páginas escritas por Rulfo que várias delas foram levadas ao cinema, algumas mais de uma vez. É o
caso de "Pedro Páramo", filmado
em 1966 e em 1976, e dos contos
"Talpa" e "O Homem", cada um
deles levado às telas duas vezes.
É com esse pano de fundo em
mente que se deve saudar a publicação, no Brasil, de "O Galo de Ouro e Outros Textos para Cinema",
de Juan Rulfo.
O livro compõe-se de três textos
de natureza bem distinta. O mais
longo deles, "O Galo de Ouro", é a
narrativa que serviu de base ao filme homônimo, dirigido por Roberto Galvadón em 1964. O roteiro
propriamente dito foi escrito por
Galvadón em parceria com ninguém menos que Carlos Fuentes e
Gabriel García Márquez.
A mesma história seria refilmada
em 1986 por Arturo Ripstein, com
o título "O Império da Fortuna".
"O Galo de Ouro", com sua estrutura contínua e linear, pode ser
lido como se fosse um conto: é a
história de um homem pobre que
enriquece apostando em brigas de
galo, e seu relacionamento com
uma cantora de botequim.
Parábola sobre a fugacidade da
riqueza material, mesclada com
um retrato do universo mental do
mexicano do interior, o texto deixa-se ler com prazer e proveito,
embora não apresente o mesmo rigor formal das obras propriamente literárias do autor.
Bem diverso é o caso de "O Despojo", roteiro de um curta-metragem de coloração fantástica dirigido pelo cineasta Antonio Reynoso
em 1960.
Um camponês é morto a tiros
por um capataz. No instante da
morte, sua imagem é congelada,
mas a ação continua, como se ele
ganhasse uma milagrosa sobrevida, na qual foge pelo deserto com a
mulher e o filho paralítico, apenas
para ver o filho morrer, algumas
horas depois.
Completam o livro dois poemas
em verso livre que serviram de texto em "off" ao filme surrealista "A
Fórmula Secreta", realizado por
Rubén Gámez em 1964.
Sobre imagens como a de um cachorro-quente gigante que escapa
da cozinha de um restaurante, ou
do linchamento de um padre por
jovens seminaristas, o texto do escritor soa quase como um panfleto
contra a fome e a injustiça social:
"Quando deixarmos de roncar
feito vespas em enxame/ ou nos
volvermos cauda de redemoinho,/
ou quando terminarmos por escorrer sobre a terra/ como um relâmpago de mortos,/ então/ talvez
chegue a todos o remédio."
Não é nenhum João Cabral de
Melo Neto, mas tem lá a sua força.
Avaliação:
Livro: O Galo de Ouro e Outros Textos para
Cinema
Autor: Juan Rulfo
Tradução: Eric Nepomuceno
Lançamento: Civilização Brasileira
Quanto: R$ 16 (95 págs.)
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