São Paulo, sábado, 12 de setembro de 1998

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LIVRO
Pesquisador catalão está no Brasil para o lançamento de "História: Análise do Passado e Projeto Social'
Fontana milita por uma história radical

SYLVIA COLOMBO
Editora-assistente da Ilustrada

O rigoroso historiador marxista inglês Eric Hobsbawm considera-o duro demais em suas críticas. Quebrando a costumeira etiqueta dos acadêmicos e deixando de lado as boas maneiras, quando o assunto é a discussão do papel do historiador na sociedade, o catalão Josep Fontana está no Brasil para o lançamento de "História: Análise do Passado e Projeto Social".
A obra de teoria da história, originalmente editada na Espanha, em 1982, chega finalmente ao Brasil em edição da Edusc (Editora da Universidade do Sagrado Coração), de Bauru.
Fontana também participou do 14º Encontro da Anpuh (Associação Nacional de História) -cujo tema era "Sujeito na História: Práticas e Representações"-, encerrado ontem em São Paulo.
"O historiador deve contribuir para a formação crítica das pessoas, não deve se desvincular da educação", disse em entrevista à Folha. "Não acho que os historiadores devam dizer como o mundo deve ser, mas, com a revisão da história, projetar uma sociedade melhor", completa.
Na defesa de uma história engajada, com uma finalidade política clara, ele critica ferozmente a escola dos Annales. Acha que o que é produzido pelos historiadores das mentalidades serve apenas para lembrar os grandes esquecimentos da historiografia. "É um saber válido porque promove um conhecimento novo, mas não tem eficácia nas mudanças sociais."
Seu livro prega que a história deve formular um projeto social que resolva as desigualdades sociais provocadas pelo capitalismo. Para chegar a esse projeto, ele aponta para uma revisão da forma como foram interpretados os fatos políticos ao longo do tempo.
Os instrumentos para tal empreitada, contudo, não seriam nada novos: "O marxismo pode propiciar a compreensão dos mecanismos que produziram a desigualdade".
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Genealogia do presente
Para chegar a essa proposição, o livro segue uma crítica à historiografia teleológica, que faz a genealogia do presente. Ou seja, que parte do presente como consequência fatal -e mesmo natural- dos fatos, relevando assim as propostas políticas que eram alternativas às que terminaram vencedoras.
Para o pesquisador catalão, essas alternativas, que parecem hoje utópicas, devem ser reinterpretadas, para se concluir se podiam ou não resultar em situações mais satisfatórias do que essa a que chegou o capitalismo. "Hoje o que nos apresenta o projeto capitalista é a fome nos países subdesenvolvidos e o desemprego nos industrializados."
Fontana considera importante, também, abandonar o referencial tecnológico como sinal de evolução política e social.
A concepção progressista tradicional da história colocava como finalidade das sociedades uma economia estável que daria acesso ao desenvolvimento tecnológico, tendo as condições sociais como reguladoras dessa equação.
Para Fontana, é preciso relativizar a Revolução Industrial e suas consequências como um referencial de progresso. Para isso, ele mostra como a chamada Revolução Agrícola, ocorrida no período neolítico (quando o homem teria "inventado" a agricultura), pôde ser minorada. "Ficou provado, depois, que os caçadores-coletores conheciam a agricultura havia milênios e só a implantaram de forma significativa depois que isso se tornou necessário, devido ao aumento populacional."
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Catalunha
Como catalão, ele analisa de maneira tranquila o conflito de nacionalidades que existe na Espanha. Acha que as diferenças entre os catalães e os outros espanhóis não evoluirão para uma guerra. "Não há conflito, as pessoas aprenderam a conviver, ainda que usando línguas diferentes. Acho legítimo estabelecer fronteira quando há elos culturais entre as pessoas, mas isso não significa ruptura."
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Livro: História: Análise do Passado e Projeto Social Autor: Josep Fontana Lançamento: Edusc (Editora da Universidade do Sagrado Coração) Preço: R$ 39 (396 págs.)


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