São Paulo, sexta-feira, 12 de outubro de 2001

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COMENTÁRIO

Os bastidores dos bastidores

SÉRGIO DÁVILA
DE NOVA YORK

Um dos temas laterais de "Os Queridinhos da América" são as "junkets". A palavra inglesa quer dizer "excursão", mas também "viagem bancada pelo dinheiro público". No caso, não é uma coisa nem outra.
Trata-se de uma prática comum aos grandes estúdios, que consiste em reunir o maior número possível de jornalistas do mundo num mesmo lugar e dia para entrevistar atores e diretores de um filme.
Os encontros acontecem num fim de semana, em hotéis de luxo de Nova York ou Los Angeles, mas também em locações turísticas como Havaí e Grécia. Não é raro que os profissionais da imprensa tenham passagem e estadia pagas pelos organizadores.
No caso da imprensa escrita, várias salas são ocupadas por entre cinco e dez jornalistas de diferentes países (os assessores cuidam para não colocar dois italianos, por exemplo, na mesma mesa), e as "estrelas" pulam de sala em sala, falando de 20 a 30 minutos.
Claro que existem as entrevistas exclusivas, mas são mais raras e geralmente reservadas para os americanos. A "junket" foi inventada pela Warner Bros. em 1932. Para promover "Rua 42", o estúdio fretou oito vagões de um trem, onde juntou imprensa e os atores Ruby Keeler e Dick Powell.
A justificativa é válida. De um lado, os atores falam com o maior número de jornalistas em menos tempo e num mesmo lugar; de outro, profissionais de países periféricos como o Brasil, que teriam dificuldade para ter acesso, podem entrevistar num mesmo dia Julia Roberts e Brad Pitt.
"Os Queridinhos da América" toca no tema, mas de leve. Como sempre, a realidade é mais rica e perversa. Já fiquei seis meses na lista negra de um estúdio por sair no meio de um filme péssimo e ter me recusado a entrevistar os atores. Outra vez, Jim Carrey quase me expulsou da sala.
Angelina Jolie me deu bronca porque perguntei sobre nudez em seus filmes. Outros brasileiros já se meteram em encrenca por teimarem em ser jornalistas. Em geral, o país está bem representado. O inferno são os outros.
Não é preconceito, mas espanta a frequência com que são convidados profissionais despreparados do Japão e do México, por exemplo, dois mercados importantes para os estúdios. As perguntas são do nível: "Qual é o seu signo?". É constrangedor.
Já vi "jornalista" pedindo autógrafo no começo e aplaudindo no final da entrevista. E dando presentes: pratos típicos, CD da banda de um primo talentoso e até um buquê de flores tropicais.


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