São Paulo, segunda, 12 de outubro de 1998

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MÚSICA
Joni Mitchell permanece indomável

EDNA GUNDERSEN
do "USA Today", em Los Angeles

Ela aprendeu guitarra sozinha, usando um manual de instruções de Pete Seeger, e tocava guitarra havaiana na faculdade de artes. Foi o início humilde de uma carreira cheia de prestígio.
Desde sua estréia em 1968 até agora, com o lançamento de "Taming the Tiger", seu elogiado 17º álbum, em que a maturidade e a independência se entremeiam em sedutoras canções, Joni Mitchell, 54, justifica os que a consideram uma das mestras do rock.
Reverenciada e imitada há 30 anos, Joni ocupa o primeiro lugar entre as sensações femininas do pop. Suas seguidoras a saúdam como sua musa e saqueiam seu legado com toda a liberdade.
Embora as sequelas da poliomielite que teve quando criança tenham restringido sua agenda nos últimos anos, a cantora canadense voltou aos palcos este ano com vigor e estilo, em turnês com Bob Dylan e Van Morrison e cantando no festival "A Day in the Garden", inspirado em Woodstock.
A partir do dia 23 voltará a apresentar-se com Dylan e, dia 6 de novembro, num show transmitido pelo sistema pay-per-view.
Embora Mitchell tenha se distanciado, há alguns anos, das entrevistas, que considera degradantes, recentemente abriu exceção. Durante um almoço de duas horas à base de massas, suco de "cranberries" e cigarros, em seu restaurante predileto em Brentwood, ela falou de temas profissionais e pessoais, desde o desprezo que sente pelo pop contemporâneo até seu prazer em ser avó. Leia a seguir trechos da entrevista.

Pergunta - Você influenciou dezenas de músicos que fazem sucesso hoje. É irritante ver seus imitadores vendendo mais que você?
Joni Mitchell -
É desanimador, mas sou obrigada a aceitar. Eles não são tão bons, mas vendem 20 vezes mais do que eu. Muitas imitações são criadas por produtores que estudam minha obra e tentam criar uma fórmula a partir dela. Aí colocam as imitações contra mim no mercado, anunciam que são o novo "eu", ao mesmo tempo em que eu continuo viva e eles me excluem da jogada. É doloroso, frustrante.
Pergunta - Você expressou essas queixas para sua gravadora?
Joni -
Tive uma atitude bem ruim. Eu disse: "Odeio e desprezo a indústria fonográfica. Não passo de alguém que está acampando aqui e que não está feliz nesse lugar". Acertamos algumas coisas, nada extraordinário. Para minha auto-estima era preciso melhorar. As gravadoras basicamente abandonam os artistas depois que eles passam a ser respeitados.
Pergunta - Isso ocorreu com você?
Joni -
Por causa de minha natureza experimental, virei artista sem gênero, então as rádios e a MTV passaram a não tocar minhas músicas. O selo diz: "Não nos importa que você não venda discos". Eu falei: "O problema é esse! Vocês não querem investir em mim. Se sou tão boa que todo mundo é comparado a mim, então me deixem participar deste negócio". Meu trabalho tem mais profundidade, amplitude, substância.
Pergunta - Como você conseguiu resistir nesse ambiente?
Joni -
Virei a tartaruga de Ésopo: devagar e sempre. A cada vez que a indústria desprezava um projeto meu e colocava alguma outra coisa num pedestal por ser nova, eu tinha que adotar uma atitude estóica e esperar. Mas acabei perdendo a paciência. Senti vontade de sair do ramo, e isso no momento em que estava prestes a fazer este álbum.
Talvez os deuses me tenham dado uma folga, porque de repente as pessoas começaram a ver que não estavam me valorizando o suficiente e passaram a me dar muitas honrarias. Sabiam que deveriam me dar alguma coisa, mas pareciam não saber realmente por quê.
Pergunta - Por que você não foi à cerimônia de sua inclusão no Rock and Roll Hall of Fame?
Joni -
Hoje parece que eles incluem no Hall of Fame qualquer pessoa que tenha feito um disco que entra na lista dos Top Ten. Então não chega a ser realmente uma honra. Meu tempo é mais bem gasto com minhas crianças. Foi meu primeiro Dia das Mães!
Pergunta - Em 1965 você teve uma filha (Kilauren Gibb) e, seis meses depois, deu-a para adoção. Recentemente você reencontrou-a e conheceu seu neto, Marlin. Agora eles fazem parte de sua vida?
Joni -
Eu os adoro. Ao lado deles, me sinto realizada. Kilauren está se separando do marido, um processo sempre difícil. Acabo de me divorciar (de Larry Klein), mas sou mais velha. Kilauren e eu fomos direto para a estrada, juntas. Com certeza podemos nos entender.



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