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MEMÓRIA
Prédio em Berlim reproduz a angústia do Holocausto; primeira exposição acontece em outubro
Museu Judaico "entorta" os visitantes
Reuters - 21.jan.99
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Mulher passa em frente ao Museu Judaico, em Berlim, Alemanha |
FERNANDA DA ESCÓSSIA
SÍLVIA CORRÊA
em Berlim
Um museu "torto" e completamente vazio. Um chão que parece
balançar. Uma torre fechada e escura. Parece estranho. E é.
Mas é assim mesmo que o Museu Judaico, em Berlim, atrai visitantes: tentando passar para eles
um pouco das sensações e da memória do Holocausto, que vitimou 6 milhões de judeus durante
a Segunda Guerra Mundial.
Projetado a partir de uma confusão de traços imaginários que
simbolizam a união desejada entre judeus e não-judeus, o museu
é um verdadeiro labirinto de corredores em ziguezague e salas vazias. Neles, há apenas pequenas
janelas irregulares de vidro que
dão passagem a um pouco de luz.
Visto de cima, o formato do
prédio -todo em estruturas metálicas- lembra tanto o de um
raio como o de uma estrela de David (símbolo judeu) quebrada.
São esses e outros detalhes dos
traços arquitetônicos os principais atrativos do lugar. Projetado
pelo arquiteto Daniel Libeskind,
um judeu polonês nascido em
1946 em uma família devastada
pela fúria nazista, o prédio comemora um ano de funcionamento
neste mês. Já recebeu mais de 100
mil visitantes, mas nunca teve exposições.
"A idéia é que, sozinho em salas
vazias e irregulares, o visitante
sinta o desconforto e o isolamento que os judeus sentiram durante
o Holocausto", diz Günter Heinickel, um dos guias do museu.
A lembrança do extermínio nazista é mais forte -quase física-
na "Torre do Holocausto". Com
25 metros de altura, o monumento de concreto simboliza o extermínio de judeus nas câmaras de
gás existentes nos diversos campos de concentração.
Na entrada da torre há uma placa sugerindo que o visitante entre
e deixe a porta de ferro bater atrás
de si. Quando ouvir o estrondo,
ele estará encerrado em um cômodo de cimento, sem nenhum
objeto, no qual o teto é altíssimo e
a única luz que entra vem por
uma pequena fresta inalcançável.
As paredes são frias e lisas, sem
janelas, sem lembranças. De dentro da torre ouve-se, distante, o
ruído do mundo lá fora.
"Muita gente sai daqui chorando. Isso é mais comum com descendentes dos judeus perseguidos. Parece que eles ressuscitam a
dor da família", diz Heinickel, para quem a torre é a melhor reprodução existente das privações a
que foram submetidos os judeus.
Saindo da "Torre do Holocausto", o visitante pode passear pelo
"Jardim do Exílio", um recanto ao
ar livre onde 49 colunas de concreto emergem do chão em memória aos perseguidos.
No jardim, a sensação é de desequilíbrio, quase de náusea: o chão
é propositalmente desnivelado,
construído com paralelepípedos
em um ângulo de inclinação de 12
graus. Do jardim, os prédios e a
cidade parecem tortos.
Acima de cada coluna, uma oliveira relembra a busca dos judeus
por sua "terra prometida".
"Aqui, a experiência é a da insegurança, a do medo, mas também
a de ver o mundo sob uma nova
perspectiva. O museu também fala da vida", diz Heinickel.
Estréia
Em outubro deste ano, a história da perseguição vai ser contada
em mais detalhes no Museu Judaico: ele vai receber sua primeira
exposição, recuperando a rotina e
as lembranças dos judeus alemães
que se espalharam pelo mundo.
Para isso, a equipe de arquivistas está fazendo uma campanha
para coletar fotos, álbuns, diários,
objetos pessoais, louças, cartas,
passaportes, brinquedos -qualquer coisa que conte histórias da
vida cotidiana das anônimas famílias judias, antes, durante e depois da perseguição nazista.
Para viabilizar a primeira exposição, judeus e seus descendentesestão sendo contatados pela direção da casa, que já começou a
receber parte do material.
No primeiro lote já há de tudo,
desde um álbum de fotografias de
uma família fugindo do Holocausto, até selos, cigarros, livros
com contabilidade de pequenas
empresas e até pautas musicais.
A primeira fase da mostra
-ainda sem prazo de duração-
vai enfocar a vida dos judeus na
Alemanha entre 1848 e 1919, ano
que termina a Primeira Guerra
Mundial.
Com a exposição, a direção do
museu espera quintuplicar o número de visitantes anuais, chegando à marca de 500 mil.
Interessados em colaborar com
essa exposição devem entrar em
contato com o Museu Judaico.
O quê: Museu Judaico
Onde: Lindenstrasse 9-14, Berlim 10969
- Alemanha
Internet: www.hagalil.com
E-mail: museum@hagalil.com
As jornalistas Fernanda da Escóssia e Sílvia Corrêa viajaram a convite do Departamento de Imprensa e Informação do governo alemão
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