|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
LIVROS
Crítica/"História do Brasil com Empreendedores"
Ensaio fica refém da ilusão do "historiador marxista"
Livro de Jorge Caldeira contesta ideias de Caio Prado Júnior, mas não inova
PAULO HENRIQUE MARTINEZ
ESPECIAL PARA A FOLHA
Neste início de século,
tangido pela apreciação amena do passado,
o livro de Jorge Caldeira é corajoso. História econômica, debate teórico e interpretações de
Marx comparecem nas duas
partes da "História do Brasil
com Empreendedores". A primeira explicita vínculos entre
as interpretações de Caio Prado Júnior e de Oliveira Vianna.
Ambos atribuem ao latifúndio
papel central na formação da
sociedade colonial. Esse enfoque, diz Caldeira, impede a
compreensão do significado
dos empreendedores na história do Brasil.
Indivíduos livres, o desejo de
enriquecer, trocas mercantis,
relações contratuais unindo
modos de produção responderiam por outra realidade histórica, distante da grande propriedade rural, da escravidão,
da exportação de gêneros tropicais. Essa é a interpretação em
construção e granjeia a segunda parte do volume.
Caldeira segue a trilha de
continuidade entre os livros de
Caio Prado, "Evolução Política
do Brasil" e "Formação do Brasil Contemporâneo", tornando-se refém da ilusão biográfica do "historiador marxista".
Para romper essa amarra, esmera-se para detectar as categorias analíticas emprestadas e
a pureza teórica das formulações de Marx. A leitura a partir
da descontinuidade seria mais
fecunda. Aqueles são livros diferentes e contêm distintas intenções de conhecimento. A recorrência do latifúndio emerge
do debate contra teses do Partido Comunista, que buscava a
revolução agrária. Caio Prado
expunha a fragilidade política e
social das reivindicações camponesas no Brasil, então defendidas pelo PCB.
Nexo externo descartado
Ao descartar o nexo externo,
sublinhado em "Formação do
Brasil Contemporâneo", Caldeira perde de vista a diferença
de escalas na análise histórica.
Fernando Novais alçou a escala
temporal da periodização do
desenvolvimento capitalista na
Europa e motivou pesquisas
sobre capitalismo e colonização. Luiz Felipe de Alencastro
projetou a escala espacial no
Atlântico Sul e calçou a investigação da história do trabalho.
Hoje, as escalas macro alimentam as "histórias conectadas".
Jorge Caldeira está interessado na história do Brasil e, assim, o nexo externo não lhe diria nada. O fato é que seus temas transitam em outra escala,
aquela da economia de mercado, apontada por Braudel. Nela,
a história da riqueza e das fortunas flui com destreza e pouparia a luta contra os moinhos
de vento do latifúndio. Na época moderna, os jogos das trocas
são a parte mais visível e ativa
da vida econômica e sugerem
dominar toda a sociedade. Contudo eles estão comprimidos
entre a dimensão material da
existência humana e a movimentação do grande comércio.
A ilusão econômica dessa supremacia é risco a ser evitado
pelo estudioso do passado.
Este ensaio de divulgação,
crivado de flechas de erudição
da teoria política, da análise sociológica e da historiografia, revela que uma ideia na cabeça e
um documento na mão não
bastam para alcançar uma história nova ou inovadora.
PAULO HENRIQUE MARTINEZ é professor no
Departamento de História da Unesp/Assis.
HISTÓRIA DO BRASIL COM EMPREENDEDORES
Autor: Jorge Caldeira
Editora: Mameluco
Quanto: R$ 49 (336 págs.)
Avaliação: regular
Texto Anterior: Crítica/"Destino: Poesia": Artificialismo marca antologia de poesia Próximo Texto: Crítica/"Breve História do Estado de São Paulo": Edição analisa originalidade de São Paulo Índice
|