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LIVRO
Radialista, produtor e jornalista Walter Silva, divulgador pioneiro da cantora e de João Gilberto, publica crônicas musicais
"Descobridor" de Elis revê a sua história
PEDRO ALEXANDRE SANCHES
DA REPORTAGEM LOCAL
Aos 69 anos, o produtor musical, radialista, locutor esportivo,
jornalista e músico paulistano
Walter Silva começa a rememorar
sua história. O primeiro produto
dessa empreitada é o livro "Vou
Te Contar - Histórias de Música
Popular Brasileira", da nova editora Códex, que será lançado hoje,
em São Paulo, no Instituto Cultural Tomie Ohtake.
"Vou Te Contar" reúne textos
jornalísticos, críticos e/ou reflexivos, escritos por Silva desde 1971
-muitos deles foram publicados
na imprensa paulistana, inclusive
na Folha, mas quase metade do livro é de textos inéditos.
Não é ainda seu livro de memórias -que ele promete para breve-, mas é suficiente para que se
revisem relações umbilicais de
Silva com artistas que, desde 1958,
ele ajudou a fazer despontar em
seu programa de rádio "Pick Up
do Pica-Pau".
Entre eles, só para citar, estão
João Gilberto e a cantora com
quem o nome de Walter Silva
sempre tem sido associado, Elis
Regina.
O comunicador rejeita, em parte, a fama de descobridor de Elis.
"Poucas pessoas sabem quem
realmente descobriu Elis. Foi um
vendedor da gravadora Continental chamado Wilson Rodrigues Poso, que a ouviu cantando
menina, aos 15 anos, em Porto
Alegre. Ele sugeriu à Continental
que a contratasse, e em 62 saiu o
disco dela. Levei Elis ao meu programa, fui o primeiro a tocar seu
disco no rádio. Naquele dia eu falei: "Menina, você vai ser a maior
cantora do Brasil". Está gravado."
Se antes ele já convivera com
Dolores Duran e Maysa, como divulgador e/ou comunicador, o
encontro com Elis traria ao sucesso estrondoso sua faceta de produtor de shows.
Entre 64 e 67, dirigiu em São
Paulo o teatro Paramount, ponta-de-lança para uma fase de shows
como "O Remédio É Bossa", "1ª
Denti-Samba" e outros pelos
quais passou toda a MPB dos 60,
com foco maior para iniciantes
como Gilberto Gil, Chico Buarque, Milton Nascimento etc. etc.
Em 65, decidido a montar um
show em dupla para Elis, tentou
Wilson Simonal e Baden Powell,
mas tudo deu errado.
Quase por acidente, o par de Elis
acabou sendo o sambista Jair Rodrigues, e o show "Dois na Bossa",
produzido por Silva, nasceu com
o destino de virar mito.
Nem assim Silva economiza objetividade ao se referir ao parceiro
que conseguiu para sua predileta:
"Ele cantava aquela porcaria de
"Deixa Isso pra Lá". Ele é descontraído, cara-de-pau, mas não é talentoso, canta qualquer coisa que
pedem. Os discos dos dois juntos
não são bons. Achei ridículo virarem programa de TV. Não acredito em repeteco".
Sem papas na língua (e com certa dose de grosseria), ele se refere
também às rivais e sucessoras de
sua Elis: "Gal Costa é uma péssima cantora, não acerta nem as letras. É mediana em comunicação
popular. Maria Bethânia é ridícula, deixa muito a desejar. As cantoras de hoje são performáticas,
querem dizer que são lésbicas antes de dizerem que são cantoras".
A acidez exagerada ele sempre
contrabalançou sendo hiperbólico, fazendo às vezes proselitismo
com seus eleitos. "Tudo que fiz foi
com muita sinceridade. Como
crítico, usei a máxima de que amigo meu não tem defeito e inimigo,
se não tiver, eu coloco", afirma.
Altos e baixos à parte, diz que a
retidão ética sempre foi uma de
suas prerrogativas, e atribui à invasão do jabaculê uma das causas
de seu relativo afastamento do rádio e das gravadoras (leia depoimento à direita).
Lembrando de seu programa
"Pick Up do Pica-Pau", Walter
Silva não foge do auto-elogio: "A
audiência percentual que tinha no
rádio não foi batida até hoje. O
que eu gostava eu tocava com insistência, era didático. Ensinei o
Brasil todo a ouvir música".
Fala, enfim, do apelido até hoje
grudado nele, "Pica-Pau": "Nunca digo isso, mas essa é uma coisa
que muito me desagradou a vida
toda. O "Pica-Pau" do nome do
programa não era eu, era para
atrair a criançada. Quando fui estrear como repórter de campo na
TV, o narrador Aurélio Campos
fez piada e disse que de perfil eu
parecia o Pica-Pau, por causa do
nariz grande".
Conclui: "Tive que assumir.
Passei a usar camisa vermelha
quando nenhum homem usava,
mercantilizei a imagem do Pica-Pau. Sempre me ofendeu ser chamado assim, mas guardei para mim. Intimamente respondo "Pica-Pau é a mãe", mas me calo.
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