CRÍTICO DA FOLHA

Por alguma razão desconhecida, nos últimos anos, a produção norte-americana adulta tornou-se cada vez mais infantil, e a produção infantil vem se tornando progressivamente o lugar de uma meditação sobre o mundo e suas coisas.
Tomemos "Dr. Dolittle 2". Aqui, um urso de circo -último macho de uma espécie em extinção- é convocado a voltar à floresta, readaptar-se à vida selvagem e fecundar a última fêmea da espécie.
Objetivo: fazer com que esse tipo de urso seja preservado, por certo, mas, sobretudo, opor-se à ação das madeireiras que pretendem desmatar o local (seu argumento é que, com a extinção dessa espécie, não há motivo para preservação).
O dr. Dolittle (Eddie Murphy), médico com o dom de falar com os animais, será o intermediário dessa operação. Ao longo dela, entraremos em contato com questões como o afastamento dos homens da natureza e a possibilidade de reencontrá-la, a luta política implícita na preservação (com direito a uma rápida bastonada nos republicanos de Bush).
Haverá até uma greve de animais que não deixará de lembrar "A Revolução dos Bichos", de George Orwell.
Para que ninguém pense que estamos restritos apenas ao mundo animal (ou à animalidade dos homens), o filme toca também em problemas mais cotidianos, como as relações familiares -em particular as que envolvem o dr. Dolittle e sua filha adolescente.
Em suma, sem ser um filme inesquecível, "Dr. Dolitte 2" tem a seu favor esse tanto de liberdade que os filmes para adultos parecem ter perdido.
E confirma o cinema infantil como talvez o único espaço de liberdade ainda disponível no cinema industrial: é pelo menos aquele em que o roteirista parece se divertir enquanto trabalha.
O resto (ou seja, a bilheteria), o carisma de Murphy garante. (INÁCIO ARAUJO)

Dr. Dolittle 2
Dr. Dolittle 2   
Direção: Steve Carr
Produção: EUA, 2001
Com: Eddie Murphy, Kristen Wilson, Raven-Symoné
Quando: a partir de hoje nos cines Butantã, Iguatemi, Eldorado, Jardim Sul, Lar Center e circuito



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