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São Paulo, domingo, 13 de julho de 2003

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MÔNICA BERGAMO

Sindicalismo chique

Ana Ottoni/Folha Imagem
É na piscina de Carlos Magno Gibrail e Dora Estevam que a diretoria da Sociedade de Moradores do Morumbi se reúne


Eles moram em ruas asfaltadas e arborizadas, não andam de ônibus nem usam posto médico ou escola pública. Ainda assim, fazem barulho. E que barulho! As associações de moradores de bairros elegantes como Morumbi, Jardins, Vila Nova Conceição e Cerqueira César têm conseguido, na Justiça-ou no grito-fechar boates, impedir construções que ferem o zoneamento e dar muita dor de cabeça à prefeitura.

MORUMBI
No Morumbi, os moradores reúnem-se uma vez por mês, sempre aos domingos, à beira da piscina do economista Carlos Magno Gibrail, diretor da grife Cori. Entre sucos e canapés, discutem os problemas do lugar. A Sociedade de Moradores do Morumbi, SMM, surgiu para impedir que casas "pequenas" tomassem o lugar dos casarões do bairro. "Uma cidade como São Paulo deve ter espaço para pessoas que tiveram mais sucesso na vida", diz Gibrail, que preside a SMM e vive numa casa de 600 mē.
 

Tudo começou há três anos, quando uma construtora tentou fazer um condomínio na rua Comandante Gastão Moutinho, no lugar de um casarão de 3.000 mē. Os moradores criaram a SMM, foram ao Ministério Público e o condomínio, até hoje, não saiu do papel: para isso, a SMM tem que dar seu OK. A construtora quer erguer 12 casas de 250 mē. A SMM quer permitir apenas seis casas, de 600 mē.

CERQUEIRA CÉSAR
A poderosa Samorcc, a Sociedade dos Amigos e Moradores de Cerqueira César, reúne os moradores das ruas entre as avenidas Rebouças, Brigadeiro Luiz Antônio, avenida Paulista e rua Estados Unidos. "É um bairro de elite. Você não vê a Versace em outros lugares", diz Dominique Adam, 54, da Samorcc. Há poucos meses, a Samorcc recorreu ao Ministério Público para evitar a construção de um prédio de 23 andares na rua Estados Unidos. Além de ferir a lei de zoneamento, dizem, a construção atrapalha a vista dos moradores -entre eles, Regina Duarte. A atriz passou a mão no telefone e disparou um chamado para o gabinete de Marta Suplicy. Foi atendida. Depois da audiência, a prefeita não escondeu de ninguém a irritação, por se tratar de assunto específico.
 

A Samorcc anda irritando de novo a prefeita: agora se uniu ao grupo de moradores e comerciantes que criou o Movimento Viva Rebouças para impedir a construção de um corredor de ônibus na avenida. A economista Fernanda de Mello, 44, é a líder. Assim que soube do corredor, saiu de porta em porta pelos prédios vizinhos, distribuiu seu cartão e marcou uma reunião. Os moradores conseguiram um acordo: enquanto discutem a obra, a prefeitura não mexe na estrutura da avenida.
 

A Samorcc conseguiu ainda fechar o Ultralounge, badalada boate GLS na rua da Consolação. Chamou o Psiu, que comprovou o som alto do lugar, e recorreu à Justiça alegando que o zoneamento não permitia o funcionamento de boates do lado direito da rua. O Ultralounge quer reabrir do lado esquerdo -mas a Samorcc continua no pé. No dia da reinauguração, há um mês, uma fila já se formava na porta. Pois a Samorcc chamou o Contru, que fiscaliza os imóveis, e impediu a reabertura porque a porta da boate...não fica a um metro da calçada!

JARDINS
Como todos os presidentes de associações, o arquiteto e urbanista Cândido Malta dedica gratuitamente horas de seu dia para a luta de bairro. Ele despacha na Sociedade de Amigos dos Jardins Europa e Paulistano, a Sajep, que inclui os jardins América e Paulista e tem entre os associados Fábio Ermírio de Moraes e Pedro Mellão.
 

O trânsito é uma preocupação grande dos moradores -o de helicópteros, que fique bem entendido. Pedro Mellão, que é genro do empresário Eugênio Staub, começou a usar um heliporto distante do bairro para não importunar os moradores, diz Malta. É de Mellão a idéia de se diminuir o tráfego aéreo do bairro. A Sajep fez uma medição do movimento de helicópteros na avenida Faria Lima, que abriga 18 helipontos. Os resultados impressionam: a área poderia ter 55 decibéis de ruído durante o dia e 50 à noite, pelos padrões do Conama (Conselho Nacional de Meio-Ambiente). Os helicópteros fazem até 95 decibéis de barulho.
 

Um documento pede às autoridades que seja suspenso o tráfego de helicópteros em baixa altitude na região.
 

A Sajep impôs também uma das grandes derrotas judiciais à prefeitura. A associação conseguiu impedir, graças a uma liminar da Justiça, que Marta Suplicy desse anistia ao comércio da alameda Gabriel Monteiro da Silva e arredores.

VILA NOVA CONCEIÇÃO
Na Vila Nova Conceição, o comércio divide os moradores -a ponto de existirem duas associações. "Eles nasceram só para defender a [butique] Daslu, que está irregular", diz o advogado Alex Canuto, presidente da Associação de Moradores da Vila Nova Conceição, sobre a rival, a Vilacon. "Queremos harmonia com o comércio, não só com a Daslu", diz Miguel Giacummo, da Vilacon, que tem em seus quadros, entre outros, os economistas Mailson da Nóbrega e Gustavo Loyola.
 

Canuto, que tem 27 anos e mora com os pais, diz que a associação já conseguiu, na Justiça, fechar os restaurantes Napoleone, Allez, Piazza Baltazar, Botânica e Gino. Luta, também, para diminuir o número de shows no parque Ibirapuera. "Grandes cantores poderiam perfeitamente cantar no Anhangabaú. O público vai aonde eles forem."


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