São Paulo, terça-feira, 13 de agosto de 2002

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Cantor retoma caminho em direção ao rock

JON PARELES
DO "NEW YORK TIMES"

Poucos depois do 11 de setembro, Bruce Springsteen estava saindo do estacionamento em uma praia de Sea Bright, cidade do Estado de Nova Jersey, quando foi reconhecido por um fã. O homem abriu a janela do carro e gritou: "Precisamos de você!". E seguiu seu caminho. Foi o tipo de momento, diz Springsteen, que faz uma carreira valer a pena.
"The Rising", o primeiro disco com novas canções de Springsteen acompanhado pela E Street Band desde 1987, leva adiante a reunião do compositor com sua banda original, iniciada com algumas poucas faixas em 1995. Para ele, aos 52 anos, o álbum representa a redescoberta da voz roqueira que ele temia ter perdido.
A maior parte dos astros pop parecia irrelevante depois dos atentados de 11 de setembro. Springsteen, que passou a maior parte de sua carreira cantando sobre os sonhos e desapontamentos norte-americanos, não se enquadrava nessa descrição. Com a iconografia em vermelho, azul e branco de "Born in the USA" (que estava longe de ser um hino patriótico) e nas narrativas e sons acumulados de suas canções, ele se transformou no bom sujeito norte-americano do rock. Leal, mas jamais complacente com relação ao seu país. Passou a representar o orgulho da classe operária, a simpatia pelos excluídos e o rock de consciência limpa.
Seu trabalho, decidiu o cantor 25 anos atrás, não era o de incorporar fantasias sobre o estrelato no rock, mas reconhecer a dignidade do trabalho comum. "Sentia que estava vendo a nobreza nas pessoas", declarou em uma de suas raras entrevistas. "Não da espécie sobre a qual lemos nos livros de história, mas da espécie sob a qual as pessoas vão trabalhar todo dia, vêm para casa todo dia e há um jantar na mesa todo dia. São as pessoas sobre as quais eu queria escrever. É isso que acredito que seja importante."
Os trabalhadores, bombeiros, policiais e passageiros de aviões que morreram em 11 de setembro são o tema das canções de Springsteen. Pessoas que se tornaram heróis simplesmente porque fizeram seus trabalhos. Ele canta sobre elas, e os sobreviventes, em "The Rising", um ciclo de canções sobre o dever, o amor, a morte, o luto e a ressurreição.
As repercussões do 11/9 permeiam as canções, mas não existe chauvinismo patriótico ou indignação pomposa, apenas histórias individuais contadas de todos os pontos de vista; o narrador que inicia uma das canções, "Paradise", é um homem bomba de nacionalidade não especificada.
"É preciso enfrentar os verdadeiros horrores que há por aí", prossegue Springsteen. "E tudo o que as pessoas têm é a esperança. É o que nos traz o próximo dia e o que quer que ele contenha. Não é possível abandonar toda crítica, mas há esperança real, fundada no mundo real da vida, amizade, família, noites de sábado."
Por volta de 21 de setembro, quando músicos e atores estrelaram uma discreta maratona televisiva em prol do Fundo 11 de Setembro, Springsteen já havia escrito uma canção para o programa, chamada "Into the Fire".
Uma semana depois, ele compôs "You're Missing", uma elegia com raízes no cotidiano, e "The Fuse", sobre a perda e o desejo.
"Into the Fire" e "You're Missing" se tornaram o que ele chama de "canções de gênese". Elas estimularam novas composições.
Após ter fama nacional com o disco "Born to Run", em 1975, ele se dedicou a parábolas sombrias e canções sobre outras pessoas: o marido fugitivo em "Hungry Heart", o prisioneiro azarado em "Johnny 99", o veterano alquebrado do Vietnã em "Born in the USA" e um paciente de Aids em "Streets of Philadelphia".
Seu álbum de 82, "Nebraska", continha histórias desoladas em formato cru, gravadas em baixa fidelidade. A seguir, ele atingiu seu pico no mercado de massa com "Born in the USA", em 1984, um disco de canções vivazes sobre as pessoas deixadas de fora da virada econômica da era Reagan.
Em "The Ghost of Tom Joad", de 1995, ele contava histórias de trabalhadores e imigrantes ao som de um violão discreto, quase folk. Springsteen divulgou o disco em shows solo, onde tocava apenas violão, e imaginava se um dia voltaria ao rock.
"Eu estava encontrando problemas para achar minha voz de rock", relembra. "Sabia que não queria mais que ela fosse o que havia sido antes, mas não sabia..."
A reunião com a E Street Band, primeiro na gravação de três canções para a antologia "Greatest Hits" (95) e a seguir para uma turnê em 99, fez com que mudasse de idéia. "Cara, passei tanto tempo aprendendo a fazer isso realmente bem e agora vou dizer que não é a minha? Acho que não."


Tradução Paulo Migliacci



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