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CONCERTO/CRÍTICA
Freire e LMP: muito bom... com reticências
ARTHUR NESTROVSKI
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS
O concerto foi muito
bom... com reticências. Muito bom: mas não maravilhoso.
Nelson Freire é sempre um prazer
de ouvir e sempre interessante. Os
London Mozart Players são um
prazer, também, mas... menos interessantes. Com um programa
tão conhecido, o prazer ficou devendo interesse -o que ainda é
muito melhor do que o contrário.
"Sturm und Drang": tempestade e paixão, mas não é o que se
imagina. Na "Sinfonia nš 49" de
Haydn (1732-1809), a paixão é, em
boa medida, um teatro de semitons e a tempestade, uma precipitação de colcheias. E é justamente
entre uma coisa e outra -entre a
experiência e a música- que o
compositor se equilibra, com ironia.
Tocar devagar tende a ser mais
difícil do que tocar depressa. Tocar Haydn devagar é ainda mais
difícil, porque o espírito fica suspenso nesse intervalo. Os London
Mozart Players começaram vacilando um pouco, no adágio. Mas
a tempestade chegou logo e, dali
em diante, a orquestra foi ficando
à vontade.
O conjunto tem altos (literalmente: as violas) e baixos (as vítimas de sempre: as trompas). Toca
com um som cheio e muita energia, num estilo direto, um tanto
anacrônico, se se pode falar em
anacronismo na música.
Fundada em 1949, sua identidade musical parece de 30 anos depois, que hoje são quase 30 anos
atrás. Foi bem regida por Jonathan Grieves-Smith, que é direto,
energético, sincrônico.
A música mudou de registro
com a chegada de Nelson Freire,
interpretando o "Concerto nš 9
para Piano e Orquestra" de Mozart (1756-91). Estranha combinação: ninguém pensa em Freire tocando Mozart.
Deveria pensar. Sua legendária
fluência faz das escalas e arpejos
desse concerto um festival de vivacidade, sem com isso perder a
melancolia.
Em Mozart, tudo é exposto, não
há onde se esconder. A profundidade está na superfície. Foi um
prazer especial ouvir este Nelson
Freire matinal e solar.
Nas cadências do terceiro movimento, em particular, o pianista
encontrou uma medida pessoal
de reticência: uma reticência exuberante, ou exuberância mineira.
A primeira delas trouxe Mozart
para a companhia de Ravel; a segunda o levou de volta para o colo
de Haydn.
Nelson Freire nunca é menos do
que interessante de ouvir. Às vezes, é bem mais. Anteontem, tocou lindamente, mas (para seus
padrões) do lado de cá do gênio.
Aplaudido espontânea e expressivamente pelos músicos da orquestra, ficou ao lado deles, um
músico entre músicos, e modestamente não deu bis.
Resto do programa: uma peça
dispensável do compositor inglês
Paul Patterson (1944) -Bartók
revisitado, com alguns efeitos
"poloneses". Ou: alguém sonhando com Tippett sonhando com
Bartók. E a indispensável "Sinfonia nš 29" de Mozart, que a orquestra tocou com vontade.
Tudo somado: foi bom de ouvir? Foi. Era Mozart e Haydn? Mozart e Haydn. Teve Nelson Freire?
Teve. Então... podemos esquecer
as reticências? Não... mas não é
motivo para não lembrar com
prazer e interesse esse concerto
sem muito interesse, mas que nos
deu muito prazer.
Avaliação:
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