|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
BLUR
Vocalista Albarn e baixista Alex James falam à Folha sobre os shows que fazem no Brasil, em novembro
Oasis me lembra Ronaldinho, diz Damon
do enviado a Londres
Três dias depois do histórico
show no Reading Festival, Damon
Albarn (vocalista e líder do Blur) e
Alex James (baixista) receberam a
Folha em um hotel em Londres
para um papo exclusivo sobre a
turnê da banda pela América do
Sul.
(LÚCIO RIBEIRO)
Folha - É a primeira vez que o
Blur, em dez anos de banda, excursiona pela América do Sul.
Que tipo de público vocês esperam encontrar por lá?
Damon Albarn - Não temos a
mínima idéia, sabia? E isso é excitante para nós. Faz tempo que estamos a fim de tocar na América
do Sul, mas nunca deu certo. Para
mim, em particular, acho que será
muito mais interessante que gastar nosso tempo tocando nos
EUA, por exemplo. Pelo menos
eu acho isso.
Alex James - Estamos numa fase em que queremos mesmo é tocar em lugares estranhos...
Folha - O que você quer dizer
por "estranhos"?
Alex - Estranhos no sentido de
não sabermos como é, como as
pessoas irão se comportar em um
show do Blur.
Damon - O negócio é que excursionamos demais por causa do álbum anterior ao "13" ("Blur",
1996) e ficamos um pouco de saco
cheio de dar shows, principalmente na Inglaterra e nos EUA.
Queremos fazer shows diferentes,
em lugares diferentes.
Folha - Alguma expectativa
em tocar no Brasil? Vocês têm
alguma informação, por exemplo, de quantos discos o Blur
vende no país, se toca muito em
rádio? Porque não vende tanto
e nem toca muito, embora vocês sejam bem conhecidos pelo
público que gosta de música
pop...
Damon - Sabemos disso. E não
acho ruim, porque quem vai ao
nosso show em lugares assim são
os que realmente estão interessados na banda, acompanham nosso trabalho, independentemente
de as rádios do Brasil tocarem ou
não nossas canções.
Alex - E, pelo que ouvimos falar
de outros grupos que tocaram na
América do Sul, os concertos de
rock no Brasil e na Argentina são
sempre quentes. O público é
enlouquecido, entusiasma a banda, o que acaba fazendo com que
os shows sejam especiais, tanto
para quem assiste como para
quem toca.
Damon - O
que posso
adiantar sobre
nossa ida ao
Brasil é que
não estamos
interessados
em visitar
Ronnie Biggs
(risos). (Ronald Biggs, que
praticou um
famoso assalto
a um trem pagador inglês,
vive no Rio e é
parada obrigatória para nove
entre dez estrelas do rock inglês que vêm
tocar no Brasil.)
Folha - E como serão as
apresentações
em São Paulo
e no Rio? Vocês vão tocar
apenas as músicas de "13" e
deixarão alguns hits antigos só para o
bis, como fizeram até agora
nos shows de
divulgação do
álbum? Ou será como no
Reading Festival, algumas
canções do
"13", mas essencialmente um
show de "greatest hits" do Blur,
mais no espírito de comemoração dos 10 anos da banda, com
o lançamento (no exterior) da
caixa com 22 singles?
Damon - Não sabemos ainda.
Vai depender do astral da banda
na época. Do que sentirmos no lugar. Somos uma banda, como você falou, que se apresenta há dez
anos. E, quando tocamos velhas
canções, é um show mais emocionante e tal. Mas um concerto só
com músicas de "13" é mais intenso. Não dá para adiantar. Talvez,
se tocássemos hoje no Brasil, fosse um show de "greatest hits". Pode ser ainda que em São Paulo o
show seja inteiramente diferente
do do Rio.
Folha - Durante dez anos de
estrada, o Blur sobreviveu incólume aos efeitos de várias ondas, como o indie dance, o grunge, o britpop. Qual a avaliação
que vocês fazem da música pop
hoje, depois destes anos todos?
Alex - Infelizmente não há muitas bandas novas que empolguem
na música pop atual, principalmente aqui no Reino Unido. Uma
coisa ruim aconteceu após a segunda metade desta década, depois que bandas como Oasis,
Pulp, Blur e Radiohead atingiram
a veia comercial da música britânica com canções de puro pop.
Quando essas bandas pararam
de vender tanto, o mercado começou a procurar grupos para
nos substituir e chegaram a Embrace, Travis, Space, Ultrasound,
bandas que não excitam ninguém, que podem ocupar por semanas o primeiro lugar na parada
sem que isso represente muito em
vendas. O pop ficou chato.
Damon - Na verdade, não gosto
de falar dessas novas bandas, porque elas são de uma geração diferente da minha, que veio depois.
Pareceria um velho rancoroso.
Elas não me empolgam, mas pode
ser que empolguem a garotada de
hoje. Sei lá.
Folha - E que tipo de som empolga você?
Damon - Acho que, ultimamente, tenho me interessado nessa
música feita hoje de Cuba para
baixo. Na verdade de Miami para
baixo...
Folha - Ricky Martin?
Damon - Não, não mesmo (risos). Tenho comprado uns CDs
de artistas cubanos. Músicas com
menos guitarras, com um baixo
pulsante, uma bateria diferente,
com vocal emocionado, com alma. Acho que é uma fase.
Folha - Mesmo adorado pelo
público inglês (a banda atraiu
sozinha cerca de 60 mil pessoas
para o principal show do festival de Reading), o Blur carrega
algumas inimizades dentro do
rock, como a histórica com o Oasis e a mais recente, com bandas
como a escocesa Mogwai e a
americana Pavement (o Mogwai
chegou a vender uma camisa
oficial que trazia a escrita "Blur
é merda"). O que a banda pensa
sobre isso?
Damon - O Blur existe há dez
anos e acho que não estou mais na
idade de deixar essas coisas me
afetarem. Nossa banda sempre viveu muitas mudanças sonoras e
ainda assim nosso público sempre cresceu, se renovou. As pessoas que vivem de música ficam
ofendidas com isso, tendem a
achar que não somos puros, dignos. O Clash viveu isso. Não damos bola para esse tipo de coisa.
Alex - Isso ocorre, talvez, porque essas pessoas parecem às vezes não gostar da própria música
que fazem, sempre a mesma. E
criam problemas com a gente
porque o Blur está sempre mudando. Sei lá.
Folha - Está na biografia autorizada da banda, "3862 Days",
que chegou recentemente às livrarias: o Blur quase acabou na
época do álbum "Great Escape"
(1995). Como foi que a banda
esteve perto do fim?
Alex - Quando pessoas ficam
juntas por muito tempo, fazendo
sempre a mesma coisa, chega
uma hora que satura, não dá
mais. Estávamos voltando de
uma bem-sucedida, mas ao mesmo tempo estafante turnê de
"Great Escape" pela América. Tocávamos por tocar, não por prazer. E todos tínhamos problemas
particulares pesados na época
(entediado, Damon foi morar na
Islândia; Alex e o guitarrista Graham Coxon se afundaram no álcool).
Demos um tempo e
não sabíamos se a
banda ia continuar.
Achava que não.
Folha - E qual é o
futuro do Blur depois de "13", dos
dez anos, da caixa
de singles, dos
shows na América
do Sul, da turnê na
Inglaterra?
Damon - É difícil
dizer. Não sabemos
o que vai acontecer
com a banda. O bom
é que aprendemos a
viver fora do Blur
(Damon tem atuado
no cinema e composto trilhas sonoras; Graham Coxon
lançou álbum solo e
tem um lado de artista plástico). Não
dá para falar nada
sobre o futuro, ainda.
Folha - Como você
vê o desmantelamento do Oasis, a
saída do guitarrista
e do baixista?
Damon - Acho
triste. Eles parecem ter perdido a
luz que tinham. Esse final assim
de uma certa forma apaga as coisas boas que eles fizeram. O Oasis
vive um processo de desconstrução. De uma certa forma, me lembram o jogador de vocês, o Ronaldinho. Muita fama parece ter feito
mal a ambos, ao jogador e à banda. Ronaldinho parece triste, perdeu a alegria de fazer o que faz.
Quando vejo os caras do Oasis,
eles me parecem tristes. Enfim...
Aliás, é verdade que surgiu um
novo Ronaldo melhor que o Ronaldinho?
Folha - Aproveitando o lançamento da caixa de 22 singles,
quais são suas canções favoritas
do Blur
Damon - Gosto muito, na verdade, dos nossos lados B dos singles, que de certa forma me lembram de quando éramos mais jovens, sonhadores, de uma certa
forma deslumbrados, selvagens.
Você não tem mais paciência
com os "lados A"?
Damon - Claro que sim. É que
às vezes ainda me surpreendo
com os tesouros que temos enterrados em lados B, desde "There's
No Other Way" ("Leisure", 1990)
até "Tender" ("13", 1999). "Popscene", "Song 2"...
Texto Anterior: Blur Próximo Texto: Relâmpagos - João Gilberto Noll: Prestes Índice
|