|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Comentário/ "This Is It"
Em forma, Michael Jackson mostra seu "grand finale" em filme
Cantor controlava com firmeza a direção do espetáculo
PAULO RICARDO
ESPECIAL PARA A FOLHA
Nos quatro anos em que trabalhei como jornalista e crítico,
tomei o cuidado de evitar resenhas e comentários de artistas
nacionais. Não queria passar
pelo constrangimento de ter
que encontrá-los nos baixos da
vida e ter que ouvir críticas à
crítica. Sei como é estar dos
dois lados do balcão.
Mas quando Michael Jackson juntou-se a James Brown
no grande Apollo dos céus, e a
Folha me pediu um artigo, não
imaginava a repercussão que
isso teria. Amigos, inimigos, conhecidos e desconhecidos se
dividiram num contra e a favor
que me fez agradecer por não
morar em Gary, Indiana.
Você pegou pesado, muitos
disseram. Juro que não foi minha intenção. Simplesmente é
impossível falar de Jacko sem
lamentar o bizarro "freak
show" em que se deixou envolver, a terrível sensação de obra
inacabada. Um crime, uma perda irreparável causada por um
"serial painkiller".
Aí fui convidado a assistir à
pré-estreia de "This Is It", documentário da turnê que marcaria a volta triunfal de Michael
a Londres e ao mundo, que o esperava como se nada daquelas
fofoquinhas e maledicências
dos tablóides, do bebê pendurado na sacada, do nariz -ou de
sua ausência-, importasse.
"Mea culpa, mea maxima
culpa"! O cara estava no auge da
forma, dançava como um Nijinski pop, cantava, mesmo se
poupando, como sereia, e controlava cada aspecto do espetáculo como uma dominatrix em
cujo chicote estava escrito "It's
all for love". Impressionante.
Com sua fragilidade de Fred
Astaire sequelado por um sem-número de cirurgias, o que
aquele menino de 50 anos desperta em nós é a vontade de levá-lo para casa, protegê-lo. Até
que começa a se mexer de um
modo estranho. E o homenino
se metamorfoseia em síntese
dos últimos cem anos da história da dança, do clássico ao jazz,
passando por break, funk e rock
com uma facilidade assombrosa, um verdadeiro mutante/
zumbi de "Thriller", porque, na
boa, o cara não é normal.
Perde mais de dez minutos
explicando em minúcias o que
quer de um acorde, muito além
da teoria musical. Dirige banda,
bailarinos e até escavadeira
com perturbadora docilidade.
Um verdadeiro leonino. O cara.
Entre os maiores sucessos de
bilheteria no mundo todo, esse
documentário que vi, e que pretendo rever e ter em DVD (ou
blu-ray ou o raio que for), é o
mínimo que Michael poderia
fazer em seu "grand finale". Um
tapa com luva de pelica em seus
detratores, um apagar das luzes
dramático e emocionado, o
adeus de um gênio na intimidade de seu habitat: o palco.
He's bad!
PAULO RICARDO é cantor e compositor.
THIS IS IT
Direção: Kenny Ortega
Produção: EUA, 2009
Onde: no Shopping D e circuito
Classificação: livre
Texto Anterior: Companhia de Ópera será bancada por Lei Rouanet Próximo Texto: "Quase Anônimos" busca riso com personagens absurdos Índice
|