São Paulo, sábado, 13 de dezembro de 1997.




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Ana Cristina apresenta um verso a mais

Editora Ática inicia em 98 o relançamento da obra da poeta morta em 1983; Folha publica poema inédito, escrito por elas aos 17 anos

Divulgação
Ana Cristina na década de 80, o momento de intensa produção


da Reportagem Local

A editora Ática promete, com o início do novo ano, um acontecimento para o mercado: a reedição das obras da poeta Ana Cristina César, que se suicidou em 1983, aos 31 anos.
Haverá então a conhecida Ana Cristina, dos já lidos versos, dos livros "A Teus Pés" e "Inéditos e Dispersos". E haverá ainda uma outra, de poemas juvenis, que, ao menos até agora, existia apenas para um pequeno círculo de amigos, parentes e fãs mais obcecados.
O plano de reedição (seus livros, antes, foram lançados pela Brasiliense) prevê três volumes: um dedicado a crítica e tradução (com "Escritos da Inglaterra", "Escritos do Rio" e ainda poemas traduzidos por ela), um segundo voltado aos ensaios e, por fim, os escritos póstumos.
A Ática também planeja, diz o poeta Armando Freitas Filho, curador dos escritos de Ana Cristina e responsável pela seleção do material nunca antes publicado, uma coletânea de sua produção poética para alunos do segundo grau.
"Há ainda muita coisa inédita de Ana Cristina", fala Freitas Filho, acrescentando que a partir do próximo mês de abril uma cerimônia oficializará a doação de documentos, textos originais e cartas ao Instituto Moreira Salles, que pretende mantê-los na sede da instituição no Rio de Janeiro.
Ana Cristina César, uma menina criada entre Niterói e Copacabana que, no final da adolescência, descobriu Londres e a atração pela língua inglesa -como mostra o poema "Childhood", escrito aos 17 anos -, passa agora também por um descobrimento no exterior.
Depois de edições na América Latina na década passada (Chile, Venezuela e Colômbia, entre outros países), a Europa passou a percebê-la.
Em outubro passado foi lançada uma edição de seus trabalhos em alemão. Pouco antes, a Inglaterra, pela Boulevard Books, conheceu seu "Diário Íntimo".
Freitas Filho acredita que este momento de Ana Cristina César, entre redescobertas e retornos, possa ajudar a dissipar alguns enganos sempre presentes quando se fala de seu trabalho e de sua vida.
Sylvia Plath
O mais repetido, e costumeiramente aceito, é a comparação de Ana Cristina com a poeta norte-americana Sylvia Plath.
Assim como em Ana Cristina, há em sua história poesia, um grande reconhecimento crítico, Londres e morte. Em 1963, aos 30 anos.
"A aproximação", diz Freitas Filho, "é apenas biográfica. O suicídio, claro, é uma ferida que não cessa nunca. A aproximação com Sylvia pode ser feita apenas no que se refere ao destino das duas, na tragédia. Poeticamente são muito distintas. Plath é mais visceral. Ana é mais cerebrina, menos explosiva."
O ambição de Freitas Filho, após o trabalho feito com a Ática, é conseguir estabelecer uma edição crítica de toda a obra poética de Ana Cristina. Segundo ele, entre os originais deixados existem muitas variantes de um mesmo poema.
Freitas Filho não sabe ainda quais as novidades e surpresas que serão finalmente oferecidas aos leitores, mas reconhece um interesse pessoal pela "juvenilia" de Ana Cristina, a produção dos anos de juventude e de sua passagem pela Inglaterra.
Um exemplo está na tradução feita por ela de um poema de Anthony Barnett ("Ana Cristina nunca me disse qual o grau de intimidade entre os dois, mas acredito que eram muito próximos"), que tem um poema chamado "Ana", de 1975.
Em "History", com uma letra pequena, quase uma sombra feita com lápis, ela escreve: "Como se mexe um dedo/ Para evitar o suicídio?".
Um pouco a semelhança de tudo que circula ao redor de Ana Cristina César, um inédito admirável, uma surpresa e um mistério imposto ao seu leitor.



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