São Paulo, quarta-feira, 14 de abril de 2004

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Festival de Buenos Aires dialoga com o novo

SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL

Com uma cartela de 320 filmes a exibir até o próximo dia 25, o Festival de Cinema Independente de Buenos Aires (Bafici) inaugura hoje sua sexta edição.
Entre os títulos selecionados estão obras inéditas de novos realizadores latino-americanos (o peruano Josué Méndez, 27, os argentinos Alejo Taube, 31, Diego Fried, 28), asiáticos (a sul-coreana Gina Kim, 30, o chinês Yu Lik Wai, 37, o japonês Nobuhiro Yamashita, 27), além de retrospectivas de diretores consagrados, como o japonês Kiyoshi Kurosawa, o chileno Raul Ruiz e o brasileiro Glauber Rocha (1939-81).
"A função de um festival não é escolher um bocado de filmes, mas redefinir o que é importante no cinema atual", diz o criador do Bafici, o crítico cinematográfico Eduardo Antín, conhecido apenas como Quintín.
O filme que abre o festival, em sessão não-competitiva, é o argentino "Los Guantes Mágicos" (As Luvas Mágicas), de Martín Rejtman, 42, sobre um taxista falido que decide vender seu carro e aplicar o dinheiro na importação de luvas mágicas.
O segundo longa de Rejtman, "Silvia Prieto" (1999), estreou no 1º Bafici, ano que apresentou ainda "Mundo Grua", o filme que atraiu a atenção internacional para a carreira de Pablo Trapero ("El Bonaerense"), então estreante.
Quintín diz que a coincidência entre o surgimento de uma geração de realizadores argentinos e a consolidação do Festival de Cinema Independente de Buenos Aires corresponde "não a uma relação de causa e efeito, mas à existência de dois fenômenos que se apóiam e são úteis mutuamente".
Para o crítico, na segunda metade dos 90, a produção de cinema na Argentina e no Brasil "começa a dar sinais de mudança, depois de décadas de paralisia, revelando uma geração de diretores muito mais jovens do que costumavam ser os conhecidos do público".
No Brasil e na Argentina, segundo o diretor do Festival de Buenos Aires, "existem grandes produtoras de cinema e produtoras de TV que, de certa forma, marcam o que é o cinema comercial". O filme independente nos dois países seria "aquele que não tem a ver com essas companhias nem possui uma intenção declaradamente comercial, como um produto".
Na opinião de Quintín, a maior parte dos cineastas argentinos cujos filmes foram vistos recentemente no Brasil "não pertence a esse núcleo de renovação, dos que fazem filmes não para responder a uma evolução histórica da filmografia de seu país, mas para romper com as tradições".
"O Filho da Noiva" (2001), de Juan José Campanella, indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro e sucesso de público tanto aqui como lá, é, na opinião de Quintín, "um filme reacionário, parecido com o que se fazia na Argentina há 30 anos, que não tenta renovar modos de produção ou estéticas nem ao menos olhar o país de uma forma nova".
O diretor Marcelo Piñeyro, de "Kamchatka" e "Plata Quemada", ambos exibidos no Brasil, "faz um cinema convencional, ainda que pretenda ter uma perspectiva autoral", segundo o crítico.
O único sucesso argentino recente que conta com o apreço de Quintín é "Nove Rainhas", de Fabián Bielinsky (2000): "Um grande filme comercial, provavelmente o melhor feito na Argentina".
O "núcleo da renovação" do cinema argentino é formado, de acordo com o diretor do Festival de Cinema de Buenos Aires, pelos já citados Rejtman e Trapero, em companhia de Lucrecia Martel ("La Ciénaga") e Lisandro Alonso ("La Libertad"), "provavelmente o mais radical de todos". De Alonso, o 6º Bafici exibirá "Los Muertos", seu segundo longa.
Além da retrospectiva dedicada à obra de Glauber Rocha, apenas um filme brasileiro integra a programação do Festival de Buenos Aires neste ano -o documentário "O Prisioneiro da Grade de Ferro", de Paulo Sacramento, que estréia no Brasil nesta sexta.
"Tivemos pouca sorte com o cinema brasileiro neste ano. Em 2003, pudemos apresentar um bom foco no cinema brasileiro, com filmes que selecionamos no Festival do Rio e no de Montréal e em vídeo. Neste ano, o material que vimos não nos convenceu. Possivelmente algum filme nos tenha escapado", afirma Quintín.
O Bafici conta com uma equipe de cinco programadores, Quintín entre eles. O festival é realizado com orçamento de cerca de US$ 500 mil (R$ 1,4 milhão) e tem o apoio da Secretaria de Cultura de Buenos Aires.


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