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"NETTO PERDE SUA ALMA"
Roteiro confunde em épico gaúcho
DA SUCURSAL DO RIO
"Netto Perde Sua Alma"
custou mais de R$ 3 milhões, levou dois anos para ficar
pronto, foi filmado no Brasil e no
Uruguai e tem cenas de batalhas
que reuniram 800 figurantes. É
um filme de apuro técnico e nobreza de intenções.
É também um filme de dois estreantes em longa-metragem, Beto Souza e Tabajara Ruas. Eles
aproveitam cada mísero plano,
mesmo os mais corriqueiros, para
mostrar que sabem iluminar e filmar. E tome sanfonas grandiloquentes, pampas às pampas,
bombachas engalanadas, enxurradas de chimarrões.
Cada fiapo de diálogo busca
transmitir, na segunda pessoa do
singular, os Desígnios Insondáveis do Destino. O elenco está à altura dessa solenidade maiúscula.
Cada mínimo esgar de cada ator,
dos protagonistas ao mais mínimo figurante, não se dirige à câmera ou ao público. Eles atuam
com os olhos fixos na História,
também com maiúscula.
História gaúcha, tchê. "Netto
Perde Sua Alma", baseado no romance do mesmo nome de Tabajara Ruas, conta as aventuras e
desventuras do general Antônio
de Souza Netto (Werner Schünemann), herói da Guerra dos Farrapos (1835-1845), movimento separatista antiimperial, proclamador da República Rio-Grandense
(1836) e combatente da Guerra do
Paraguai (1861-1866).
O filme foi trombeteado na imprensa gaúcha como o maior épico nacional de todos os tempos.
Seus diretores foram comparados
ao italiano Sergio Leone, ao sueco
Ingmar Bergman e a cineastas japoneses.
Descontado o provincianismo,
do qual nenhum Estado brasileiro
que faz cinema está livre, a começar pelo paulista, "Netto" parece
ter algo a dizer aos gaúchos. Ele
talvez seja um momento de afirmação regional.
Para quem não é gaúcho, ou para quem não leu o romance de Tabajara Ruas, o filme é de difícil
compreensão. Com um pouco de
distração, e o filme tem um sem-número de distrações, não dá
nem para entender direito quando e por que o caudilho perde a
sua alma.
O enredo vai para a frente e para
trás, batalhas se misturam, Netto
faz uma vigorosa profissão de fé
republicana e pouco depois relata
seu respeitoso encontro com dom
Pedro 2º, alista negros no seu batalhão e é dono de escravos.
O que era claro no romance virou uma confusão no filme, cujo
roteiro é assinado por nada menos que cinco pessoas, inclusive
os diretores. O que resulta se situa
a meio caminho entre o enaltecimento visual do Rio Grande do
Sul e a exposição marmórea de
um herói.
O filme assume acriticamente a
imagem que o egocêntrico Netto
faz de si mesmo. As suas justificativas e a sua pomposidade ridícula se sobrepõem pesadamente,
por exemplo, ao drama dos escravos que ele trai.
"Netto Perde Sua Alma" tem os
elementos que, bem dosados, injetariam sangue regional numa
cinematografia dominada por
Rio e São Paulo. Do jeito que ficou, é uma tosca composição provinciana.
(MARIO SERGIO CONTI)
Netto Perde Sua Alma
Direção: Tabajara Ruas e Beto Souza
Produção: Brasil, 2001
Com: Werner Schünemann, Sirmar Antunes
Quando: a partir de hoje no Espaço
Unibanco, Internacional Guarulhos e ABC Plaza
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