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BALÉ
Gulbenkian esbarra em estereótipos e tolices
ANA FRANCISCA PONZIO
ESPECIAL PARA A FOLHA
A atual temporada do Ballet
Gulbenkian no Brasil traz a
mais importante companhia portuguesa em fase de renovação. No
entanto, o programa escolhido
peca pelo desequilíbrio. Ter a assinatura de Jiri Kylian em uma das
coreografias sempre enobrece e
confere atração a todo espetáculo.
O problema foi fazer de "Stamping Ground" a peça de encerramento, frustrando expectativas
de quem aguarda um grande final. Concebida a partir da convivência de Kylian com aborígenes
australianos, "Stamping Ground"
é obra referencial. Mas, para ser
mais bem apreciada, exige do espectador uma visão de conjunto
da carreira de Kylian.
Sob tal perspectiva, "Stamping
Ground" soa como um exercício
que permitiu ao coreógrafo somar novas possibilidades ao seu
vocabulário. Quem conhece o que
Kylian criou depois pode perceber quão fértil foi para ele conhecer particularidades das danças
aborígenes, como os contramovimentos. Ao mesmo tempo, como
todo ocidental que tenta se apoderar de elementos culturais típicos, Kylian não escapou das armadilhas, esbarrando na expressão primitiva estereotipada.
No mesmo programa, a tentativa de mostrar a dança contemporânea portuguesa por meio de um
de seus pioneiros, Rui Horta,
também resultou em uma escolha
infeliz. "À Mesa em 15 Minutos"
representa um lugar-comum da
dança atual, na qual sobram conceitos interessantes que decepcionam na prática. Aparentemente
original, a proposta de Horta de
associar o preparo de comida a
um processo de depuração acaba
convergindo para a tolice. Como
um tecido esgarçado, cujas tramas não se completam, a coreografia e os afazeres culinários, no
fundo do palco, não aprofundam
suas sintonias.
No conjunto, o destaque fica para a peça de abertura -"Nuti", de
Meryl Tankard, que faz do requinte visual o seu principal atributo. Inspirada em figuras egípcias da antiguidade, ela obtém belos resultados graças a uma sofisticada projeção de slides, elaborada pelo fotógrafo Regis Lansac.
Em movimentos lentos, os bailarinos caminham de perfil pelo
palco, lembrando procedimento
semelhante lançado por Nijinsky,
quando ele criou "Après-Midi
d'un Faune", baseado nas pinturas de vasos gregos. Essa possível
citação não tolhe a identidade estética de "Nuti", capaz de despertar um estado de contemplação.
Avaliação:
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