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MÚSICA
Cantora lança segundo CD independente; Milton e outros artistas desfazem vínculo com grandes gravadoras
Gal lidera bloco dos "sem-contrato"
PEDRO ALEXANDRE SANCHES
ENVIADO ESPECIAL AO RIO
"A internet vai mudar a cara das
gravadoras e o futuro da discografia. Não será mais preciso comprar um disco de Gal Costa, as
pessoas comprarão suas faixas
avulsas na internet."
Quem faz a profecia é a cantora
Gal Costa em pessoa, no exato
momento em que lança "Todas as
Coisas e Eu", seu segundo álbum
sob o signo "independente" (embora goze de distribuição da Som
Livre, da Rede Globo).
Afirmando que não manterá
mais contrato fixo com gravadora, Gal vem de negociação tumultuada com a Indie Records, que
banca o CD. Tomado por sambas-canções das décadas de 20,
30, 40, 50, 60 e 70, ele seria gravado também em DVD, mas o alto
orçamento foi vetado pela Indie.
Seu caso não é isolado. Desde
que Maria Bethânia inaugurou a
onda, mudando-se da BMG (de
onde também saiu Gal) para a independente Biscoito Fino, mais e
mais artistas da geração heróica
da MPB têm ficado sem contrato
fixo com uma multinacional.
Milton Nascimento acaba de
anunciar o encerramento de sua
união com a Warner. João Bosco
saiu da Sony, Simone não está
mais na Universal, Paulinho da
Viola se separou da BMG.
Um empresário de grande artista afirma à Folha, sob condição de
não se revelar, que contratos de
grande vulto e cheios de mordomias persistem na grande indústria apenas como resquícios. Segundo ele, quem continua numa
grande gravadora teve obrigatoriamente que rediscutir -para
menos- as bases de contrato.
A empresária de Maria Bethânia, Maria Luísa Jucá, confirma
essa avaliação. "A gravadora queria rediscutir o contrato de Bethânia, por causa da crise do mercado. Mas artistas do porte dela são
inegociáveis, seria um desrespeito
à história de Bethânia", diz Jucá.
Desfeito o vínculo, o primeiro disco independente de Bethânia,
"Maricotinha ao Vivo" (2002),
vendeu 100 mil cópias.
A empresária de Milton Nascimento, Marilene Gondim, diz que
seu caso foi diferente. "Quando a
Warner sentou para conversar sobre renovação com Milton, ele
disse que não queria", afirma.
Segundo ela, Milton quer desenvolver seu próprio selo passando a gravar artistas jovens, e
isso seria comercialmente inviável dentro da Warner.
Por ironia, o artista sai da Warner após haver apadrinhado a
chegada de Maria Rita (350 mil
cópias vendidas) à gravadora.
O presidente da companhia,
Cláudio Condé, nega que os altos
custos de manter Milton houvessem sido trocados pelo giro rápido de Maria Rita. "Não existe relação entre os dois fatos. A Warner
contratou Maria Rita pelo seu talento e porque acreditou no que
ela representaria para a MPB."
Mesmo quem continua em
grande gravadora testemunha a
mudança de condições em tempos recentes. É o que diz Airton
Valadão Jr., empresário de Jorge
Ben Jor, contratado da Universal.
"Fazer um bom contrato hoje é
muito mais difícil que há quatro
ou cinco anos. A Universal está
respeitando tudo que negociamos, mas Jorge está facilitando,
conhece a realidade."
De volta a Gal Costa, a maior
voz feminina do tropicalismo hoje regrava sucessos de Araci Cortes, Dalva de Oliveira, Isaura Garcia, Dick Farney, Altemar Dutra,
Elis Regina etc., sob produção do
global Mariozinho Rocha.
Ela não reconhece relação entre
a instabilidade atual e as constantes oscilações de sua carreira e
seus discos recentes. "Não tem
que entender onde estou focando,
tem que ver que estou cantando
lindamente, melhor que nunca",
responde à pergunta sobre uma
eventual falta de foco definido em
sua obra recente.
Diz que canta os temas de fossa
"Brigas", "Fim de Caso", "Nervos
de Aço" etc. de forma leve, em pique de "alto astral", sem nexo
com a dor-de-cotovelo em voga
nos anos 50. E não se importa que
isso pareça contraditório. "Tudo
na vida é contradição, meu filho."
TODAS AS COISAS E EU. Disco de Gal
Costa. Lançamento: Indie/Som Livre.
Quanto: R$ 28, em média.
O jornalista Pedro Alexandre Sanches
viajou a convite da Indie Records.
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