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Crítica/"O Homem que Engarrafava Nuvens"
Documentário mostra vitalidade do baião
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
Perto do final de "O Homem que Engarrafava
Nuvens", Humberto
Teixeira diz que seu sonho é o
de "um único mundo, sem
fronteiras e sem guerras". O
maior mérito desse belo documentário é mostrar o potencial
integrador da arte que Teixeira
e Luiz Gonzaga criaram: belezura universal, patrimônio da
humanidade inteira e não só do
sertão do Brasil.
Lírio Ferreira busca as origens do baião, em imagens de
época, em depoimentos iluminadores, mas não com espírito
de folclorista. Seu foco é o que
essa música, poesia, ainda tem
de viva e fecunda. Mais do que a
raiz, o que interessa é a seiva.
Por isso, o núcleo do filme é
uma apoteose multicultural.
Vemos o baião cantado e dançado em japonês, em espanhol
(num filme italiano!), em inglês. David Byrne, sem medo do
ridículo, canta "White Wing"
com chapéu de cangaceiro.
A essa altura, já teremos
constatado que essa música
perpassa toda a cultura brasileira do século 20, da chanchada ao tropicalismo, da era do rádio ao mangue beat.
No contrafluxo desse movimento para fora, do sertão para
o mundo, o filme documenta a
viagem íntima da atriz Denise
Dumont em busca do pai,
Humberto Teixeira, com quem
teve uma relação problemática.
Um momento forte é a conversa de Dumont com a mãe, a
pianista Margarida Jatobá (que
morreu depois das filmagens),
em que esta fala sobre a separação do casal e, de quebra, ilumina o lado machista sertanejo do
"doutor do baião".
O filme recusa o potencial
melodramático desse desvelamento familiar, optando por
um tratamento discreto. Um
exemplo: Denise Dumont relata seu último encontro com o
pai, na véspera da morte dele.
Em vez de a câmera "buscar"
suas lágrimas, há um corte seco
e entra a imagem documental,
silenciosa e em preto e branco,
de Teixeira montando num camelo. Poesia visual pura.
Faltou falar da montagem dinâmica, que cria coesão a partir
de distintos registros e texturas, e da câmera que revela em
detalhes a beleza dos instrumentos e dos indivíduos.
O HOMEM QUE ENGARRAFAVA
NUVENS
Direção: Lírio Ferreira
Onde: Cine Bombril, Espaço Unibanco Augusta, Frei Caneca Unibanco
Arteplex e HSBC Belas Artes
Classificação: livre
Avaliação: ótimo
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