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LITERATURA
Quase três anos após a crise deflagrada em 2001, escritor afirma estar esperançoso quanto ao futuro da Argentina
"Vimos que o caos tem limite", diz Martínez
Reuters
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Milhares de argentinos fazem protesto contra a violência, em Buenos Aires, em abril deste ano |
DA REDAÇÃO
Apesar de esperançoso quanto
à recuperação da Argentina depois da crise deflagrada em 2001,
Tomás Eloy Martínez vê com
preocupação a movimentação
por conta da questão da segurança. "Algumas medidas extremas,
quase fascistas, têm sido consideradas por setores da sociedade",
diz, referindo-se ao que ficou conhecido como caso Blumberg. Abaixo, o escritor
comenta a Argentina hoje, depois
de quase três anos do chamado
"estallido".
(SYLVIA COLOMBO)
Folha - A história de "El Cantor de
Tango" se passa no fim de 2001,
por que investigar a crise por meio
de um romance?
Martínez - Foram os tempos
mais conturbados da história recente da Argentina, talvez os piores. Quatro meses em que o país
se encontrou à beira de um abismo e com a forte impressão de
que podia desaparecer do mapa.
Com o romance, quis conceber
um aleph desses momentos históricos. O que está presente constantemente é esse labirinto da história. O livro é um labirinto de
histórias dentro da História.
Folha - Com os olhos de hoje, que
balanço você faz da crise de 2001?
Martínez - Ela marcou uma tomada de consciência de que o
caos tem um limite. O país está,
lentamente, levantando a cabeça.
Hoje há, acredito, um horror ao
abismo, à derrota absoluta, à perdição e à idéia de permitir que os
argentinos possam considerar
que o futuro pode um dia ser pior.
Folha - Você é, então, otimista?
Martínez - Mais do que isso, sou
esperançoso. Creio que o país está
muito melhor do que há três anos.
Há um controle mais forte sobre a
corrupção, uma vontade coletiva
de detê-la. Mas há problemas graves que persistem, como a pobreza. Ou a deterioração do nosso
sistema educacional, que sempre
foi bom. E há uma certa inquietude social sobre a insegurança, o
medo dos seqüestros, roubos etc.,
que é algo preocupante.
Folha - O caso Blumberg é emblemático dessa tomada de consciência?
Martínez - Esse caso é muito significativo porque tem muitos
pontos de contato com o que
aconteceu em dezembro de 2001.
Naquela época, houve um levantamento de uma classe média indignada porque lhe haviam capturado e liquidado as poupanças.
Agora, este cidadão, Blumberg, se
tornou o líder de uma série de
pessoas dessa mesma classe média que viram afetada a sua segurança. O que se deve atentar é que,
por meio dele, se está exigindo
medidas muito mais violentas do
que os delitos cometidos -algumas delas quase fascistas.
Folha - E o curioso é que, nos dois
casos, não há politização, as pessoas clamam por direitos sem que
isso reflita posições ideológicas.
Martínez - Exatamente, são apenas pessoas exigindo seus direitos. Em 2001, era a abolição dos
políticos, o "que se vayan todos".
Agora se reivindicam penas
maiores para os delinqüentes. O
perigo da despolitização nesse caso é que faz com que sejam defendidas medidas extremas, e não se
pode penalizar roubos ou seqüestros com esquadrões da morte,
por exemplo.
EL CANTOR DE TANGO.
Autor: Tomás
Eloy Martínez. Lançamento: Planeta
(importado); no Brasil, em outubro, pela
Companhia das Letras. Quanto: 19,5
euros (253 págs.). Onde encomendar:
www.casadellibro.com ou
www.livcultura.com.br.
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