São Paulo, sábado, 15 de junho de 2002

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Tradutor e professora apontam falta de humor como falha das versões existentes no mercado nacional

Ritmo moderniza clássico de Cervantes

DA REPORTAGEM LOCAL

Com seus quase 400 anos, a serem completados em 2005, "Dom Quixote" é "perfeitamente atual". Essa idéia foi a bússola a que se agarrou Sérgio Molina durante o processo de transposição da obra de Cervantes para o português.
Tradutor de alguns dos maiores nomes da literatura hispano-americana contemporânea, como Jorge Luis Borges, Ernesto Sábato e Mario Vargas Llosa, Molina iniciou a empreitada quixotesca em 2000 disposto a "atualizar" a linguagem de Cervantes. Poucos testes mais tarde, ele chegou à conclusão de que seu Quixote "modernizado" ficava "sem gosto".
"Percebi que era possível apresentar o texto no seu ritmo mais fresco, sem ter de construir uma peça de museu", diz Molina.
Ritmo é a palavra-chave para esse argentino que aprendeu a língua portuguesa ouvindo canções de MPB, antes de se mudar para o Brasil, com nove anos.
"As traduções existentes no mercado brasileiro não preservam o ritmo e o humor originais de Cervantes, justamente elementos que fazem com que esse texto antigo chegue tão fresco até hoje", observa a "cervantista" Maria Augusta da Costa Vieira.
Um dos motivos da falta de "frescor" das versões existentes apontado tanto pela professora quanto por Molina é a predominância de lusitanismos. "É importante driblar a passagem do texto por Portugal. O espanhol do século 17 tem muitos pontos de contato com o português que se desenvolveu no Brasil. Tem coincidências que ficaram aqui e não em Portugal", afirma o tradutor.
Segundo Molina, a grande dificuldade da tradução está nos versos que Cervantes espalha ao longo da narrativa. Alguns deles são exatamente o que falta para que a tradução do livro 1 seja concluída.
É que "Dom Quixote" é dividido em dois tomos. "El Ingenioso Hidalgo Don Quijote de la Mancha" saiu em 1605. Em 1614, quando escrevia a continuação do livro, já bastante popular, Cervantes foi surpreendido pela edição de uma sequência pirata, assinada por Alonso de Avellaneda.
O autor acelerou os trabalhos e publicou o segundo volume em 1615, um ano antes de morrer. "Como ele levou dez anos para fazer o segundo, terei uma década para concluir a tradução", brinca Molina.
(CASSIANO ELEK MACHADO)


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