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Atração da próxima Mostra de Cinema de SP, a
iraniana Samira Makhmalbaf, 18, filha
do diretor de "Gabbeh", fala com
exclusividade à Folha sobre seu
filme, que relata a prisão de
duas crianças, intitulado
a maçã
ERIKA SALLUM
da Reportagem Local
"Para Zahra e Massoumeh, que têm
13 anos, mas aparentam ter 2, porque
passaram 11 anos na prisão."
Mohsen Makhmalbaf, em dedicatória do roteiro de "A Maçã"
A história é verídica: duas garotinhas iranianas permaneceram 11
anos trancadas em casa pelos pais.
Até que, em 97, os vizinhos resolveram denunciar o fato às autoridades. A notícia abalou até mesmo
as rígidas leis do Irã e virou manchete dos jornais locais.
A aberração seria apenas mais
um "faits-divers" na turbulenta
república islâmica, mas uma garota de 18 anos resolveu ir além e
transformou-a em filme: "A Maçã" -que participará da 22ª Mostra de Cinema de São Paulo, em
outubro, e foi destaque no último
Festival de Cannes.
Mais um dado importante: Samira é filha de Mohsen Makhmalbaf, um dos mais elogiados cineastas do Irã, diretor de "Gabbeh".
Com a desculpa de que faria um
curta-metragem, a garota pediu ao
pai sobras de películas de seu novo
filme, "O Silêncio", do qual é assistente de direção. Delas, nasceram "A Maçã", cujo roteiro é assinado pelo próprio Mohsen.
Leia abaixo trechos da entrevista
exclusiva que Samira Makhmalbaf
deu à Folha, por fax, de Teerã. Nela, a cineasta confirmou: vem ao
Brasil em outubro para a mostra.
Folha - Por que você decidiu filmar a história dessas garotinhas?
Samira Makhmalbaf - Eu assisti
a uma reportagem na TV e achei
que aquela era uma situação muito
absurda. Eu não conseguia parar
de pensar no assunto. Queria saber
quais são razões que levam um pai
a fazer tal coisa com suas filhas.
Folha - Pode-se dizer que seu filme é um documentário?
Samira - Digamos que ele se situa entre documentário e ficção.
Folha - A maçã percorre todo a
trama e dá título ao filme. Qual seu
significado para o povo iraniano?
Samira - Em nossos poemas, a
maçã é símbolo da vida. Quando
crianças, nossos pais nos contam
que a razão pela qual viemos à Terra foi a maçã que Satanás deu a
Eva. Ou seja, essa fruta é símbolo
da vida e do conhecimento.
Folha - Você não usou atores, as
pessoas interpretam elas mesmas.
Como foi esse trabalho?
Samira - Rodei tudo em tempo
real, logo após o pai ter sido denunciado. Fui à casa da família e
contei sobre o filme. Eu sabia quais
seriam suas reações, mas não ditei
os diálogos. Para conseguir que as
garotas "atuassem", tive que usar
dois caminhos: instigá-las a participar e me imitar, já que as duas
são retardas e não falam.
Folha - Seu pai escreveu o script
do filme. Como foi o processo de
trabalho com ele?
Samira - Quando você faz um
filme, é necessário desenvolver um
roteiro antes. Porém, o caso de "A
Maçã" foi especial. O script foi
sendo escrito enquanto eu rodava
o filme. Meu pai e eu sempre conversávamos sobre as cenas nas
noites anteriores à sua filmagem.
Nós discutíamos sobre elas, mas
não determinávamos detalhadamente quais seriam os diálogos
utilizados pelos "atores".
Folha - Você é mulher num país
onde as mulheres ocupam uma posição delicada. E é jovem, num ligar onde ser jovem não é fácil. Como lida com isso?
Samira - Assim como você pode constatar (ou seja, fazendo filmes como esse).
Folha - Como o Irã encara a existência de uma cineasta -e jovem?
Samira - O futuro das pessoas é
mais importante para mim do que
seus pontos de vista...
Folha - Apesar de ser uma história sobre um pai que tranca suas
filhas, você não faz nenhum tipo
de julgamento no filme.
Samira - Eu não sou juíza, e cinema não é uma corte. Para mim,
cinema é um espelho que você coloca na frente da sociedade...
Folha - Contar essa história para
o povo iraniano pode mudar algo?
Samira - Algumas pessoas podem mudar e se corrigir quando
virem seu reflexo no espelho.
Folha - Você abandonou a escola
aos 15 anos. Por quê?
Samira - Eu larguei a escola por
causa do cinema. As locações dos
filmes do meu pai são a melhor escola que posso ter.
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