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MEMÓRIA
Professor de vários músicos, maestro alemão naturalizado brasileiro morreu anteontem aos 90 de mal de Alzheimer
Koellreuter opôs vanguarda ao nacional
IRINEU FRANCO PERPETUO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
O meio musical brasileiro perdeu anteontem uma de suas figuras mais influentes e galvanizadoras. O compositor alemão naturalizado brasileiro Hans-Joachim
Koellreuter morreu no hospital
Santa Isabel, em São Paulo, depois
de uma longa luta contra o mal de
Alzheimer.
Nos últimos cinco anos, Koellreuter estava aos cuidados de Áurea, a empregada que o acompanhou por mais de 20 anos. Sua
mulher, a cantora Margarita
Schack, restringiu drasticamente
o contato social. O único amigo
autorizado a visitá-lo era o compositor, aluno e médico Mauro
Muszkat.
"Ele estava muito preservado e
não teve grande alteração comportamental. Além disso, a Áurea
cuidava muito bem dele. O que
estava comprometido era a fala e
a memória", afirma Muszkat, que
visitou o compositor no último
dia 2, quando completou 90 anos.
Nascido em Friburgo (região de
Breisgau), Koellreuter era flautista de formação e foi aluno de regência de um dos grandes maestros germânicos do século passado, Hermann Scherchen (1891-1966), antes de radicar-se no Brasil, em 1937, fugindo do nazismo.
Por aqui, logo começou a exercer atividade pedagógica de destaque, tornando-se o principal divulgador do dodecafonismo e de
outras técnicas composicionais
"avançadas" da época. Com a
criação, em 1939, no Rio, do movimento música viva (documentada no livro "Música Viva e H. J.
Koellreuter", de Carlos Kater, ed.
Musa), ele foi reconhecido como
o líder da emergente vanguarda
musical brasileira.
A reação não tardou. Pupilos de
Koellreuter, os compositores
Cláudio Santoro, Eunice Catunda
e Guerra-Peixe abjuraram das posições do mestre em favor do nacionalismo. Outro autor nacionalista, Camargo Guarnieri, em
1951, elevou a temperatura dos
ataques com uma "Carta Aberta
aos Músicos e Críticos do Brasil",
no qual o dodecafonismo é atacado como "corrente formalista que
leva a degenerescência do caráter
nacional de nossa música".
A polêmica só fez aumentar a
vontade de Koellreuter em disseminar suas idéias, com incansáveis atividades didáticas e musicais pelo país, incluindo a fundação da Escola de Música da Bahia,
em 1954. Seguiu-se um período
fora do Brasil, no Instituto Goethe, em Munique (1963), na Índia
(1964) e no Japão (1969).
De volta ao Brasil, em 1975, parecia haver incorporado conceitos da música e da filosofia oriental, bem como elementos aleatórios, à sua estética.
Firmou a imagem de um polemista de sotaque forte, sobrancelhas grossas e vestes exóticas, que
defendia suas posições com prosa
articulada e retórica exaltada.
Popular sua música nunca chegou a ser, nem entrou no repertório de artistas e orquestras brasileiras. Como professor, nunca se
preocupou em produzir "clones"
de si mesmo. Por isso, seus discípulos são tão heterogêneos
-Tom Jobim, Tom Zé, Isaac Karabtchevsky, John Neschling e Júlio Medaglia, entre muitos outros.
A jornalista Regina Porto pretende transformar em livro sua
extensiva pesquisa no acervo de
Koellreuter.
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