|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TEATRO
Espetáculos de Moçambique, Cabo Verde e ilha da Reunião são destaques em megaevento sobre a arte do continente
África contemporânea entra em cena no Rio
VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL
"Vai ser muito importante ver o
resultado do que os nossos antepassados que foram para aí vos legaram", afirma a diretora Manuela Soeiro, em bom português moçambicano. "Gostaria de vos dizer
que a população de Cabo Verde é
"doente" pelo Brasil. Segue as novelas todas, conhece os atores todos, vibra com a seleção canarinho, tem um Carnaval à imagem
do brasileiro (à nossa escala, claro!)", diz o diretor João Branco.
A partir desse entrelaçamento
histórico e cultural do Brasil com
o continente africano, o megaevento Arte da África, que acontece na sede carioca do Centro Cultural Banco do Brasil até janeiro
próximo, inclui na programação
a Mostra de Teatro Africano. São
três espetáculos daquele continente e um brasileiro.
A mostra começa hoje com uma
temporada-dobradinha do Grupo Teatral do Centro Cultural
Português do Mindelo (Cabo
Verde), que apresenta o espetáculo "Palhaços Crioulos de Deus", e
com o Bando de Teatro Olodum,
de Salvador, dirigido por Márcio
Meirelles, que traz uma das montagens de um repertório que valoriza a consciência negra, "Cabaré
da Rrrrraça" (1998).
Na próxima semana, o grupo
Mutumbela Gogo, de Moçambique, encena "Sexo? Sim, Obrigada
- Ou a Arte de Guanguissar". No
final de outubro, a mostra será encerrada pelo Théâtre Talipot, grupo que vem da ilha da Reunião,
com o espetáculo "Kalla, o Fogo".
Moçambique e Cabo Verde são
ex-colônias portuguesas (ilha da
Reunião é francesa). Em entrevista à Folha, Soeiro e Branco relatam como fazem teatro forte em
condições precárias.
O Mutumbela Gogo surgiu em
1986. Na língua local, "mutumbela" significa mascarado, referência ao Carnaval de Maputo. "Primeiro, trabalhamos a partir de
contos, poemas ou excertos de romances que dramatizávamos por
não termos textos de dramaturgos moçambicanos, e não ficávamos à espera deles. Tínhamos que
avançar, trabalhar com nossos escritores", diz Soeiro, 58.
No caso de Cabo Verde, o desafio não foi propriamente canalizar
energias para o nascimento de
uma dramaturgia, mas antes reinventar estruturas elementares para dar à luz o fenômeno do teatro.
"Tivemos o primeiro projetor em
1997, quase quatro anos depois de
termos formado o grupo", afirma
Branco, 35.
Segundo ele, a comédia "Palhaços Crioulos de Deus" pode ser
definida como um espetáculo-coreografia baseado na figura do
clown, que contrapõe a idéia de
pecado tal como é imposta pela
cultura ocidental. Por isso a eleição do tripé-alvo: a autoridade, a
religião e o absurdo cotidiano.
"É um afrontamento a toda série de intermináveis proibições
com as quais as sociedades se encarregam de socializar os seus indivíduos", diz Branco, assistente
do português Miguel Seabra, que
dirige o espetáculo.
Escrita por Jacopo Fo, filho de
Dario Fo e Franca Rama, "Sexo?
Sim, Obrigada..." é a peça adaptada pelo Mutumbela Gogo. Duas
mulheres conversam sobre sexualidade, sobre a arte de conquistar. "É um texto que desmistifica o sexo e ataca os medos e preconceitos de uma forma provocativa, mas didática, com humor;
brinca sem desprezar receios tão
escondidos e profundos. É uma
peça a favor da sexualidade sem
discriminação", afirma Soeiro.
Texto Anterior: Marcelo Coellho: Com músculos e tiros de bazuca Próximo Texto: Projeto inclui artes plásticas, música e cinema Índice
|