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CINEMA/ESTRÉIAS
"HEDWIG"
Ópera-punk foi imaginada por John Cameron Mitchell durante vôo
Diretor cria transexual por rebeldia
MILLY LACOMBE
FREE-LANCE PARA A FOLHA, EM LOS ANGELES
O personagem transexual pós-punk Hedwig foi criado por John
Cameron Mitchell, 38, que, cansado do corporativismo televisivo
americano -do qual fazia parte
trabalhando como ator em comédias-, decidiu entrar no teatro,
um meio que, segundo ele, é infinitamente mais autêntico.
"Além de ser mais barato e fácil
de montar, tem interação com a
platéia e, o que é mais importante,
possui uma comunidade mais
unida, com menos egotrips."
A teoria de Mitchell sobre as diferenças entre um e outro meio
afirma que o teatro é um ambiente mais saudável, porque não é
possível se drogar tendo que fazer
oito shows por noite. "Atores
hollywoodianos são carentes, inseguros e usam drogas porque
não têm a interação com a platéia
para saber se estão agradando.
Precisava fugir dessa neurose."
Na fuga, Mitchell escreveu sua
obra mais célebre: uma ópera-punk cujo personagem central é
um cantor transexual alemão que
foge do comunismo em busca da
fama na América.
Após sete anos de sucesso no
circuito off-Broadway, ele decidiu
que era hora de apresentar Hedwig ao mundo cinematográfico.
"Havia imagens que eu gostaria
de ver de forma mais alegórica."
Nascimento
Foi numa viagem de avião de
Los Angeles para Nova York, há
quase dez anos, que teve inspiração para começar sua ópera-punk. "O filme de bordo era muito ruim, e fui passear pelo avião.
Conheci Stephen Trask [compositor e ator" e ali mesmo, a milhares de metros do solo e por pura
insatisfação com o sistema, decidimos escrever algo que pudesse
ser caracterizado como uma ironia pós-moderna. Foi um ato de
pura e deliciosa rebeldia", diz.
Nascia Hedwig, cantor e compositor de rock que, ao chegar à
América, se apaixona por Tommy
Gnosis, personagem que simboliza o corporativismo norte-americano e que passa de amante a plagiador, fazendo sucesso à custa do
talento de Hedwig.
"O nome Tommy Gnosis foi tirado da noção "nostic gospel",
uma visão do gênesis na qual Eva
é a doadora de sabedoria e força
positiva. Hedwig é Adão e Eva
juntos, o paraíso em um."
Mitchell explica que a teoria
central da obra é a de que todos
temos uma outra metade, princípio proposto por Platão sobre a filosofia da origem do amor.
A adaptação para o cinema foi
sucesso de crítica, vencedora no
Festival de Sundance e serviu para
emancipar o personagem.
"Agora vou me dedicar a coisas
novas. Fazer um filme semibiográfico sobre um garoto gay em
uma escola católica irlandesa e
depois um outro sobre sexo explícito, que aborde o tema de forma
bacana, e não alienada e monótona como normalmente é feito."
A respeito de se entregar novamente ao corporativismo hollywoodiano, John Cameron Mitchell garante que agora tudo é diferente. "Hedwig me mostrou que
é possível fazer cinema sem ter de
fazer parte do sistema."
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