São Paulo, sexta-feira, 16 de fevereiro de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Crítica/"Dreamgirls - Em Busca de um Sonho"

Bill Condon tenta dar lustre histórico e sociocultural ao seu bom musical

SÉRGIO RIZZO
CRÍTICO DA FOLHA

Talento não tem limite de peso, demonstra Jennifer Hudson ao roubar a cena (diversas cenas, a rigor) em "Dreamgirls - Em Busca de um Sonho". Beyoncé Knowles pode ser mais esguia e sensual, mas a voz do povo, manifestada com freqüência em duas ou três ovações durante as sessões do filme nos EUA, já decretou que é da gordinha que todos por lá gostam mais.
Revelada por uma eliminação supostamente injusta no programa "American Idol" em 2004, Hudson tornou-se a escolha perfeita, estilo "a arte imita a vida", para o papel da cantora que, embora versátil e vibrante, é substituída como líder de um grupo de soul por uma voz de menor força em um corpo de maior apelo. Eis uma candidata a estrela em sintonia com seu tempo, o dos "reality shows" e dos 15 minutos de fama que proporcionam a "pessoas comuns".
O diretor e roteirista Bill Condon escreveu também "Chicago" (dirigido por Rob Marshall), mas as semelhanças entre esses dois musicais bem-sucedidos com o público norte-americano (cerca de US$ 170 milhões de bilheteria no primeiro caso; quase US$ 100 milhões, e ainda crescendo, com "Dreamgirls") quase terminariam aí, não fossem ambos baseados em espetáculos populares (e paradigmáticos) na Broadway.
Enquanto "Chicago" vive do movimento e da coreografia, inspirada no trabalho original de Bob Fosse, e também de uma picardia politicamente incorreta, "Dreamgirls" representa a vertente do gênero que se sustenta nas canções, nas interpretações, no carisma de palco de alguns atores e no bom-mocismo de suas, argh, "mensagens". Não por acaso, a adaptação mantém a estrutura teatral em forma de números, que beneficiam não só Hudson mas também Eddie Murphy em sua versão James Brown.

Cultura negra
A ambição, no entanto, vai mais adiante: ao se concentrar em um grupo fictício que se espelha na trajetória de The Supremes (com a personagem de Knowles no lugar de Diana Ross), "Dreamgirls" recria a inserção negra na cultura pop dos EUA e sua assimilação pelo público branco durante os últimos 50 anos.
É uma leitura luxuosa, no sentido carnavalesco, de um movimento histórico que incluiu sangue (os conflitos pela igualdade de direitos civis, os assassinatos de Martin Luther King e Malcolm X) e que ainda se manifesta hoje em episódios de tensão racial. Buscar esse lustre, o de drama de época com reverberações socioculturais, não o promove a nada muito
mais nobre do que ser um bom musical sobre uma moça destinada a comer o pão que o ex-empresário e ex-amante (Jamie Foxx) amassou - e a dar a volta por cima.


DREAMGIRLS - EM BUSCA DE UM SONHO    
Direção: Bill Condon
Produção: EUA, 2006
Com: Jamie Foxx, Beyoncé Knowles, Eddie Murphy e Jennifer Hudson
Quando: estréia hoje nos cines Iguatemi Cinemark, Frei Caneca e circuito


Texto Anterior: Crítica/"A Turma da Mônica em uma Aventura no Tempo": Animação valoriza humor antenado das tirinhas e resolve fôlego curto das tramas
Próximo Texto: Vilão de "Turistas" diz que polêmica é "equivocada"
Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.