São Paulo, sábado, 16 de maio de 1998

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Loach proporciona o melhor momento

do enviado a Cannes

O roubo por um time de várzea de uma coleção de uniformes da seleção brasileira campeã do mundo de 1970 funciona como a grande pausa cômica do tocante "My Name Is Joe" (Meu Nome É Joe), que Ken Loach apresentou ontem na competição de Cannes-98.
As camisas amarelas de Pelé e cia. substituem o surrado conjunto branco e preto da Alemanha campeã de 1974 no medíocre time do ex-alcoólatra Joe Kavanagh (Peter Mullan).
Joe junta-se à galeria de humilhados e ofendidos da Grã-Bretanha contemporânea celebrada pela engajada obra de Loach. A partir de uma história de amor em Glasgow, Loach revela as raízes do desajuste social no Reino Unido pós-Thatcher.
A assistente social Sarah (Louise Goodall) conhece Joe num dos subúrbios mais carentes da capital escocesa. Um casal de jovens toxicômanos faz a ponte entre eles. Acabará também por separá-los.
Endividados com o chefe do tráfico local, levam o bondoso Joe a aceitar a tarefa de transportar duas encomendas de drogas. Cansada de confrontar-se cotidianamente com as consequências do vício, Sarah descobre o que Joe dela ocultava. Ao romper com ele, catalisa o capítulo final da tragédia.
Na obra de Loach, menos (produção) é mais (cinema). Seu forte é revelar a intimidade dos deserdados e os detalhes concretos da falência do Estado de bem-estar social.
"My Name Is Joe" dá conta de ambos com uma fluência narrativa e com uma delicadeza de registro que fazem parecer fácil. Tanto não o é que nada chega nem sequer perto de "Joe" em termos de excelência cinematográfica até aqui neste festival. Pode não ser a Palma -mas já é um clássico.
Das drogas que destroem vidas na Escócia atual para as que pautavam arte nos EUA da era hippie. Sai "Joe", entra "Fear and Loathing in Las Vegas". Num piscar de olhos, do melhor ao pior de Cannes-98.
"Fear and Loathing" adapta um marco do jornalismo literário americano, de Hunter S. Thompson. Em 1971, ele fez uma reportagem sobre uma corrida de carros próxima a Las Vegas. Thompson transformou-a num misto de ensaio e novela sobre como o sonho americano fez-se pesadelo. A missão jornalística virou uma odisséia lisérgica para Thompson e seu advogado, dr. Gonzo.
Gilliam optou por um tratamento cartunesco. Tudo é berrante, exagerado. A letra do texto está lá, mas o filme acaba sendo fiel não a Thompson, mas sim às ilustrações surreais de Ralph Steadman para o livro.
Johnny Depp estrela. É outro fracasso para sua coleção. (AL)



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