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"EU E OUTRAS POESIAS"
Augusto dos Anjos, o poeta da vida
REYNALDO JARDIM
ESPECIAL PARA A FOLHA
A 43ª edição de "Eu e Outras
Poesias", de Augusto dos
Anjos, revista e ampliada, é de um
primor gráfico rigoroso e belo. É a
melhor de quantas se editarem,
trazendo textos de Antonio
Houaiss, Orris Soares, Otto Maria
Carpeaux, Francisco Assis Barbosa. Faltou o texto de Ferreira Gullar, que organizou uma das edições.
Há ainda uma cronologia histórica e reprodução de capas anteriores. Só não encontro o nome
da pessoa responsável pela organização da obra.
Nenhum outro poeta brasileiro
revelou em seus escritos mais visceral amor à vida e a certeza de
que a morte é o antônimo de nascimento e não de vida, que inclui
os dois pólos da existência em seu
transcurso.
Chamar Augusto dos Anjos de
"poeta da morte" tem sido uma
blasfêmia resultante de leitores
pouco atentos ao sentido vital que
informa a poemática desse autor
singular, que não deixou herdeiros na história de nossa literatura.
Linguagem
Solitário porque não encontramos pares em seu passado, no
curso de sua vida e em sua posteridade. Augusto dos Anjos começa e só não acaba em Augusto do
Anjos porque, apesar da complexidade de conceitos e linguagem
nada populares, conquistou uma
platéia que abarca gente simples
de parcas letras até eruditos de alta linhagem.
O curioso é que o leitor sem
maiores luzes se deleita com o vocabulário encantatório cientificista, objeto de rejeição dos mais letrados.
A tragicidade de Augusto dos
Anjos não é mórbida, ele não se
compraz com a degradação, apenas vai buscar no âmago da matéria a permanência de vida.
No corpo em decomposição,
encontra todo um universo em
transmutação permanente. A vida se multiplica e prolifera em outras formas de fantástica vitalidade.
Egos da humanidade
O "eu" que intitula sua obra não
é autobiográfico, nem ególatra. É
um eu que extrapola o limite epidérmico e abarca, de maneira vertical e cósmica, todos os egos da
humanidade, estabelecendo uma
comunhão espiritual com quem o
lê. Se não é o único, será, certamente, fator decisivo de um sucesso que o tempo não deseja esgotar.
Os conceitos existencialistas
não são suficientes para enquadrar a obra em questão em seus limites. Essência e existência aparecem sem precedência de um fenômeno sobre o outro. Existiram
desde sempre em uma sincronicidade integrada, não dicotômica,
na cadeia evolutiva das espécies,
humanas ou não. É o que se infere
da leitura dos poemas.
Seria um elucidativo serviço se a
próxima edição contivesse um
glossário dos termos científicos
que dificilmente o leitor conhece
o significado.
Se o risco é desvendar a palavra
de sua sonoridade encantatória, o
benefício seria o valor didático
enriquecendo nosso entendimento, pois deveria mostrar o significado do termo dentro de contexto
poemático.
Reynaldo Jardim é poeta, jornalista e
fundador do jornal "Sol" nos anos 60
Eu e Outras Poesias
Autor: Augusto dos Anjos
Editora: Bertrand Brasil
Quanto: R$ 35 (294 págs.)
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