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São Paulo, segunda-feira, 16 de junho de 2003

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ERUDITO/CRÍTICA

Orquestra Experimental de Repertório, regida por Jamil Maluf, encenou obra de Stravinsky no Municipal

As frustrações de um "Édipo Rei" arrojado

ARTHUR NESTROVSKI
ARTICULISTA DA FOLHA

Um não é pouco; dois, nesse caso, infelizmente, foi demais. Ou de menos, para ser justo com a memória da música. Em abril, a Osesp apresentou uma versão de concerto de "Édipo-Rei", a ópera-oratório de Stravinsky (1882-1971); a cidade agora entra para algum livro dos recordes com a segunda encenação da mesma peça, na versão da Orquestra Experimental de Repertório, regida por Jamil Maluf.
O Municipal estava cheio na estréia, sexta passada, e a expectativa era alta. Não só pelos solistas -benquista prata da casa: Fernando Portari no papel principal, Céline Imbert de Jocasta, mais Pepes do Valle, José Gallisa e Luciano Botelho, e Celso Frateschi como narrador -mas também pela participação do Balé da Cidade (Cia. 2), em coreografia de Mara Borba, que também assina a direção cênica e de arte.
Composta em 1926, com libreto de Jean Cocteau (traduzido para o latim), "Édipo Rei" tem a estrutura de uma pequena ópera, com coros, recitativos e árias, mas se resguarda do teatro ao assumir caráter de oratório, com a ação narrada por um recitante. O registro neoclássico da partitura redobra-se, dessa forma, na dimensão hierática, para não dizer estática, da cena.
Foi para resolver o problema que Mara Borba trouxe a dança para o palco. Os cantores seguem mais ou menos imóveis, uma vez destacados nalgum ponto do cenário; o coro divide-se em grupos, nas laterais; no centro, contra o vermelhão do fundo, os oito bailarinos vão alegorizando o teatro íntimo, dando forma e movimento às comoções do rei patricida de Tebas e sua rainha-mãe.
Forma: estilizada, geométrica, "grega". Movimento: espástico e repetitivo, "simbólico". Assim como o cenário, assume explicitamente a inspiração em Bob Wilson. Perguntas: será que a dança acrescenta alguma coisa à ópera? Será que escapa do ilustrativo? Do ornamental? Será que não vira só um dispersivo clip "ao vivo" para as vastidões abstratas da música e do texto?
Constrangidos pela encenação, e pelo figurino helenopunk, os cantores sustentaram a dignidade. Frateschi tem ótima projeção e narra com segurança. A OER não chega a tanto, mas é valente.
As últimas duas produções do maestro Maluf ("João e Maria", "O Chapéu de Palha de Florença") marcaram época. Com "Édipo Rei", a aposta foi mais arrojada; e o engano, proporcional. Em novembro, tem "Contos de Hoffmann".


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