São Paulo, terça-feira, 16 de julho de 2002

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DISCO/CRÍTICA

Temas quentes do pop atual norteiam "Coleção Nacional"

DA REPORTAGEM LOCAL

Não se deixe enganar pelo título. Apesar do jeitão de coletânea, "Coleção Nacional" é um trabalho autoral de quilate, em que algumas das questões mais candentes da música pop atual ganham corpo brasileiro.
Se a autoria permanece bem demarcada no trabalho do Instituto, mesmo com a propalada ameaça de extinção da espécie, ela já não tem a feição de antes. Os autores fogem das câmeras fotográficas e se escondem por trás de um elenco diversificado de coadjuvantes.
O trabalho coletivo é outra questão premente. Após décadas de individualismo pop no Brasil, o Instituto faz-se cimento agregador de pop sólido, forte, grupal.
Exemplares disso são faixas como "Na Ladeira" (belíssimos vocais de Roger Man, do Bonsucesso Samba Clube, pandeiro de Pupilo, da Nação Zumbi, flauta de Alexandre Basa, do Mamelo Sound System) e "O Dia Seguinte" (vocais contidos de Otto, sample do "Tim Maia Racional", scratches de Zé Gonzales).
Outro elemento de frente é a circulação de conhecimento. Ideologicamente, o Instituto expõe seus convidados ao confronto musical, à ameaça ao já sabido e sedimentado. Rappin" Hood, dizem os produtores, se assustou e de cara desgostou do resultado de "Dia de Desfile". Não se reconheceu em sua criação -era a ameaça dando asas desconhecidas ao rapper.
O intercâmbio de conhecimento tem seu ápice na participação do fortíssimo Sabotage. O Instituto queria extrair samba do jovem rapper. Rica e Tejo o ajudaram em "Cabeça de Nego", compondo perspicaz sonoridade de samba enquanto ele fazia a letra ferina.
Sabotage aprendeu e fez, solitária e brilhantemente, o samba-rap "Dama Tereza", possível marco de um novo momento do pop daqui -isso se for ouvido, tanto nas periferias do hip hop quanto nos bunkers da classe média.
O Instituto está, em suma, catalisando e fazendo circular todo esse aparato. A indústria, que tem em garotos como eles faca e queijo para empurrar a música brasileira ao século 21, prefere cair nas arapucas que ela própria armou.
De volta ao autor, se ele é espécie em extinção? Pode até ser, mas quem desgosta do mico-leão, da baleia, do golfinho, do Instituto?
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)


Coleção Nacional    
Grupo: Instituto
Lançamento: Instituto/YB Music
Quanto: R$ 25, em média




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