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"ESCADA DE GIZ"
Esboço aparente de espetáculo vence riscos da experimentação
SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA
"Escada de Giz" é um espetáculo em forma de esboço. Esse é seu grande mérito e sua
grande coragem. Não é, portanto,
inacabado por falta de tempo,
nem se apóia na cumplicidade da
platéia para justificar com falsa
ideologia (enquanto "denúncia
dos meios de produção do espetáculo", por exemplo) o fato de parecer incompleto.
Deborah Serretiello e Lúcia Romano se expõem em fragmentos
de ações e situações cotidianas,
sem a rede de segurança da narrativa. O roteiro enigmático, finalizado por Rubens Rewald após
longa pesquisa coletiva, se de
-senrola quase por associação livre, e só aos poucos o público passa a discernir e à identificação.
Assim, embora não se saiba ao
certo quem são essas mulheres ou
qual a relação entre elas, desse
distanciado ponto neutro afloram
aos poucos temas reconhecíveis.
Em suave coreografia, o medo
da morte se une ao jogo de esconder do recém-nascido; o trauma
do primeiro dia de aula -com toda a eloquência do choro infantil- é vencido pela fábula, com
toda a força poética do realismo
fantástico (como figurar esse "elefantônio" que salva as crianças
perdidas?). Aqui também se parte
da pesquisa do movimento, sendo o texto como legenda possível
para as imagens essenciais que,
apesar da liberdade de associação,
não são arbitrárias: partem da
pesquisa do folclorista Luís da Câmara Cascudo (1898-1986), o que
justifica, se houver necessidade,
que sejam apresentadas de modo
breve e sistemático, como verbetes de enciclopédia.
O que mantém o interesse do
público é a apurada técnica das
atrizes. Esse "teatro gestual" depende inteiramente de sua carismática entrega, elas que há três
anos buscam dar forma ao inefável, sem garantia de um ponto de
chegada possível. Ajudadas pelo
belo figurino, por um cenário essencial e pela delicada trilha sonora, ainda precisam de reajustes na
direção, em lentidões às vezes
desnecessárias e um ou outro preciosismo. Mas, sem riscos, não há
teatro experimental e, sem ele, feito de esboços e pequenas epifanias, o teatro seria apenas um descartável produto de consumo.
Escada de Giz
Direção: Raquel Ornellas
Dramaturgia: Rubens Rewald
Com: Lúcia Romano e Deborah
Serretiello
Onde: Centro Cultural São Paulo (r.
Vergueiro, 1.000, Liberdade, São Paulo,
tel. 0/xx/11/3277-3611)
Quando: ter. e qua. (21h), até 27/8
Quanto: R$ 10
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