São Paulo, domingo, 16 de agosto de 2009

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Livro "Noturno" mostra vampiros longe de clichês

Escritor Chuck Hogan, que assina trilogia com o cineasta Guillermo del Toro, diz que não quis "fazer parte de uma moda"

Romance, idealizado antes da febre de sanguessugas, foge do glamour do gênero ao "devolver os seres ao seu lugar de quem é sujo"

RAQUEL COZER
DA REPORTAGEM LOCAL

"Pense num homem de capa preta. Com caninos grandes. E um sotaque engraçado", diz, numa cela de Nova York, em 2010, um velho que durante a Segunda Guerra teve a mão esmigalhada por um vampiro. "Agora esqueça a capa, os caninos e o sotaque engraçado. Esqueça tudo o que é engraçado."
Dadas as variações de tramas vampirescas que têm rondado telas e livrarias, a sugestão soa promissora. Ela é feita por um personagem de "Noturno", primeiro romance em parceria do cineasta Guillermo del Toro e do autor de thrillers Chuck Hogan, e dá pista de que não haverá ali nada do que livros do gênero costumam mostrar.
Primeira parte de uma trilogia imaginada em 2005 por Del Toro, "Noturno" saiu há dois meses nos EUA, onde frequentou listas de mais vendidos, e chega agora ao Brasil em meio a uma "epidemia" indesejada.
"Posso dizer que não seria a minha escolha fazer parte de uma moda", desdenha Hogan, 42, falando por telefone à Folha, de Nova York, sobre "True Blood" e "Crepúsculo" -que a mulher dele, aliás, adora. O autor, best-seller nos EUA e premiado por "Prince of Thieves" (que será levado ao cinema por Ben Affleck), iniciou conversas com Del Toro em 2006, quando essa febre não era tão evidente.
"Nosso livro fica longe desses outros, como você notou, como qualquer um nota, e me sinto ótimo com isso", ele diz. "Devolvemos os seres ao seu lugar de quem dorme na poeira, é sujo e muito, muito perigoso".
Em texto para o "New York Times", Del Toro e Hogan explicam sua versão da história. Contam que, quando John William Polidori juntou "folclore, ressentimento e ansiedades eróticas" em "O Vampiro", no século 19, criou a base de todas as tramas do gênero. Mas o mito no qual ele se baseou, escrevem, era "tão velho quanto a Babilônia". E "tratava de bestas primitivas que se alimentavam do sangue dos vivos".
A trilogia introduz as criaturas como uma espécie de vírus que infecta os ocupantes de um Boeing 777 assim que ele aterrissa, para, em seguida, alastrar-se por Nova York. São como parasitas que, aos poucos, tomam o corpo dos humanos.
A trama segue vários personagens e envolve descrições minuciosas de astronomia, biologia, anatomia. A certa altura, explica-se por que vampiros devem ser quentes, e não gelados. E como se desenvolvem, na garganta, as glândulas que serão misto de aparelho circulatório e digestivo nesses seres.
O preciosismo resultou num processo de criação -com textos enviados e reescritos por e-mail- muito extenso. O que, além de levar os vampiros de Del Toro e Hogan a chegarem com atraso em relação à mania mundial, os fez perder a vez para "Fringe", série de TV, de J.J. Abrams, de início muito similar -com um avião que aterrissa "morto" em Nova York.
Questionado sobre a coincidência, Hogan diz que a intenção de Del Toro era fazer de "Noturno" uma série de TV, e que o cineasta chegou a sugeri-la a um canal, com a cena do avião. "Só que queriam algo meio humorístico, e não era a vontade dele", diz o autor. "Não dá para dizer que foi dali que "Fringe" veio, mas ... Ah, você sabe. Ideias. Elas estão por aí."
A dupla agora finaliza a segunda parte da trilogia, a sair em 2010. "É uma nova experiência escrever sabendo que há tanta expectativa. Talvez isso faça eu me empenhar para não decepcionar ninguém", diz, e em seguida se corrige: "Mas, ok, o segundo livro vai ainda mais fundo que o primeiro. Não tenho com que me preocupar".


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