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Crítica/"Noturno"
Trama violenta funcionaria melhor na tela
SANTIAGO NAZARIAN
ESPECIAL PARA A FOLHA
Vampiro não é coisa de
mulherzinha. Devolver
às criaturas da noite
sua carga escabrosa parece ser
a premissa de "Noturno", escrito numa parceria de fôlego entre Guillermo del Toro (cineasta de filmografia irregular, com
filmes como "Labirinto do Fauno", "Hellboy" e "A Espinha do
Diabo") e Chuck Hogan (autor
de best-sellers de suspense
pouco conhecidos no Brasil).
Começa de forma brilhante.
Um avião pousa em Nova York
e permanece em silêncio, com
as luzes apagadas, sem que nenhum passageiro ou tripulante
saia. Logo chegam equipes de
segurança para checar o que se
passa: sequestro, epidemia, pegadinha do Mallandro? (OK, a
última opção não é cogitada). A
narrativa é lenta, fermentando
o suspense e as expectativas pela revelação do que, já sabemos,
será uma história de vampiros.
Ao aparecerem, os sanguessugas continuam surpreendendo. Passam longe da elegância
gótica do gênero, estando mais
próximos de um misto de invasores de corpos alienígenas e
zumbis. Não é uma releitura
inédita -é próxima, por exemplo, dos vampiros de "Cem Dias
de Noite" (a HQ e o filme)-,
mas é interessante como o romance explica e disseca, literalmente, os dentuços, trazendo
descrições anatômicas e analisando o processo de contágio.
O texto retrata a invasão em
diversos lares, numa estrutura
fragmentada, que pode ter facilitado a escrita a quatro mãos.
Ainda assim, os autores mesclam de forma homogênea contos de fadas, catástrofe aérea,
thriller epidemiológico, ficção
científica, mitologia lovecraftiana e, claro, histórias clássicas
de vampiros. (Impossível não
ver a chegada do avião como
uma versão atualizada da viagem de navio de Drácula, no romance de Bram Stoker.)
Mas a falta de personagens
tangíveis tira boa parte do carisma do texto (note que, aqui,
não foi necessário dar o nome
de um único personagem). Não
há ninguém para torcer, nem
mesmo a personificação do mal
num vilão instigante -o mestre dos vampiros surge no terço
final, sem personalidade definida. E, após a revelação da epidemia dos vampiros, o romance descamba para descrições de
violência que podem funcionar
na tela, mas que têm poder de
assombro reduzido em texto.
Primeiro de uma trilogia, o livro ainda tem o desfecho brutalmente postergado, o que é
frustrante após percorrer mais
de 460 páginas e ter só uma vaga ideia de quem é o vilão e
quais são seus planos. "Noturno" se mostra um belo projeto.
Pode gerar ótimo filme ou série, mas despreza as armas
mais fortes da literatura: identificação e aprofundamento.
NOTURNO
Autores: Guillermo del Toro e Chuck
Hogan
Tradução: Sérgio Moraes Rego e Paulo
Reis
Editora: Rocco
Quanto: R$ 46,50 (464 págs.)
Avaliação: regular
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