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CINEMA/ESTRÉIA
"A SOMBRA DO VAMPIRO"
Norte-americano E. Elias Merhige recria origem do expressionismo e da linguagem do cinema
Diretor faz homenagem ao pai do terror
SÉRGIO DÁVILA
DE NOVA YORK
Em 1922, o alemão F.W. Murnau inventou o cinema de horror
com o mudo "Nosferatu", até hoje o melhor filme de vampiro. O
ator que interpretava o personagem-título, também chamado de
conde Orlock, era o inescrutável
Max Schreck, sobre quem se contavam inúmeras histórias.
Uma delas dizia que Schreck, ele
próprio, era um sugador de sangue. O diretor nova-iorquino E.
Elias Merhige, 37, parte do princípio de que a história é verdadeira
para fazer seu "A Sombra do
Vampiro", uma bela, divertida e
bem-humorada homenagem ao
gênero e ao cinema.
Merhige conversou com a Folha por telefone.
Folha - Você nasceu no Brooklyn,
em Nova York. É impossível deixar
de perguntar onde estava em 11 de
setembro.
E. Elias Merhige - Tenho família
em Nova York, na rua 30, e eles viram o World Trade Center ser
atingido. O mundo mudou de um
jeito permanente desde então.
Abrimos uma caixa de Pandora e
agora estamos vendo a vida de
um jeito como nunca havíamos
visto. Espero que isso consiga unificar o mundo de alguma forma.
Em vez de os países se interessarem simplesmente por seu povo,
sua sociedade, poderiam pensar
no mundo como um todo.
Folha - Como você conseguiu recriar o visual de filme mudo sem
parecer pastiche?
Merhige - Meu primeiro filme,
"Begotten", de 1991, é mudo. Saiu
em DVD, por sinal, se alguém se
interessar. Sou profundamente
influenciado pelos filmes mudos,
pelo expressionismo, pelas pinturas românticas. Tudo o que aconteceu do século 16 até o começo
do século 20 me interessa muito.
Há muitas revoluções acontecendo nesse período, o pensamento
humano está tomando forma e
evoluindo.
Folha - E por que especificamente
"Nosferatu" e Murnau?
Merhige - "Nosferatu" é o pai de
um gênero. Senti que o fim do século 20 era uma época perfeita para lidar com a origem desse gênero e refletir sobre o começo do cinema. Havia muita gente criativa,
que estava de fato criando uma
linguagem, um jeito de se comunicar visualmente. Fritz Lang,
Murnau, esses caras estavam inventando a linguagem que nós, cineastas, usamos até hoje.
Quis mesmo encarar todo o
simbolismo de recriar, hoje em
dia, o sentimento de fazer um filme numa época em que nenhuma
das perguntas sobre o cinema estava respondida. É incrível a idéia
de um artista ser transgressor e
querer criar uma obra de arte tão
perfeita que acaba destruindo vidas humanas no caminho.
Folha - Nesse sentido, é um filme
sobre fazer um filme, não?
Merhige - Eu ampliaria essa idéia
para dizer que é um filme sobre a
criação da arte e como isso é semelhante a chegar ao coração de
um vulcão. Uma coisa que não é
boa nem ruim, mas tem uma força imensa que consome o artista.
Às vezes, até destrói o artista.
Folha - O que você vai fazer em
seguida?
Merhige - Estou trabalhando em
vários projetos neste momento.
Termino um roteiro agora que
pretende responder às perguntas
"Qual é a verdadeira natureza da
justiça?", "Qual a natureza do
mal?". Por causa dos acontecimentos de 11 de setembro, estou
reescrevendo a história de modo
que a audiência de 2001 assista ao
filme e que ele tenha um grande
significado. Mas isso é tudo o que
eu quero falar agora.
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