São Paulo, sexta-feira, 16 de novembro de 2001

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CINEMA/ESTRÉIA

"A SOMBRA DO VAMPIRO"

Norte-americano E. Elias Merhige recria origem do expressionismo e da linguagem do cinema

Diretor faz homenagem ao pai do terror

SÉRGIO DÁVILA
DE NOVA YORK

Em 1922, o alemão F.W. Murnau inventou o cinema de horror com o mudo "Nosferatu", até hoje o melhor filme de vampiro. O ator que interpretava o personagem-título, também chamado de conde Orlock, era o inescrutável Max Schreck, sobre quem se contavam inúmeras histórias.
Uma delas dizia que Schreck, ele próprio, era um sugador de sangue. O diretor nova-iorquino E. Elias Merhige, 37, parte do princípio de que a história é verdadeira para fazer seu "A Sombra do Vampiro", uma bela, divertida e bem-humorada homenagem ao gênero e ao cinema.
Merhige conversou com a Folha por telefone.

Folha - Você nasceu no Brooklyn, em Nova York. É impossível deixar de perguntar onde estava em 11 de setembro.
E. Elias Merhige -
Tenho família em Nova York, na rua 30, e eles viram o World Trade Center ser atingido. O mundo mudou de um jeito permanente desde então. Abrimos uma caixa de Pandora e agora estamos vendo a vida de um jeito como nunca havíamos visto. Espero que isso consiga unificar o mundo de alguma forma. Em vez de os países se interessarem simplesmente por seu povo, sua sociedade, poderiam pensar no mundo como um todo.

Folha - Como você conseguiu recriar o visual de filme mudo sem parecer pastiche?
Merhige -
Meu primeiro filme, "Begotten", de 1991, é mudo. Saiu em DVD, por sinal, se alguém se interessar. Sou profundamente influenciado pelos filmes mudos, pelo expressionismo, pelas pinturas românticas. Tudo o que aconteceu do século 16 até o começo do século 20 me interessa muito. Há muitas revoluções acontecendo nesse período, o pensamento humano está tomando forma e evoluindo.

Folha - E por que especificamente "Nosferatu" e Murnau?
Merhige -
"Nosferatu" é o pai de um gênero. Senti que o fim do século 20 era uma época perfeita para lidar com a origem desse gênero e refletir sobre o começo do cinema. Havia muita gente criativa, que estava de fato criando uma linguagem, um jeito de se comunicar visualmente. Fritz Lang, Murnau, esses caras estavam inventando a linguagem que nós, cineastas, usamos até hoje.
Quis mesmo encarar todo o simbolismo de recriar, hoje em dia, o sentimento de fazer um filme numa época em que nenhuma das perguntas sobre o cinema estava respondida. É incrível a idéia de um artista ser transgressor e querer criar uma obra de arte tão perfeita que acaba destruindo vidas humanas no caminho.

Folha - Nesse sentido, é um filme sobre fazer um filme, não?
Merhige -
Eu ampliaria essa idéia para dizer que é um filme sobre a criação da arte e como isso é semelhante a chegar ao coração de um vulcão. Uma coisa que não é boa nem ruim, mas tem uma força imensa que consome o artista. Às vezes, até destrói o artista.

Folha - O que você vai fazer em seguida?
Merhige -
Estou trabalhando em vários projetos neste momento. Termino um roteiro agora que pretende responder às perguntas "Qual é a verdadeira natureza da justiça?", "Qual a natureza do mal?". Por causa dos acontecimentos de 11 de setembro, estou reescrevendo a história de modo que a audiência de 2001 assista ao filme e que ele tenha um grande significado. Mas isso é tudo o que eu quero falar agora.



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