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"A ONDA DOS SONHOS"
Surfe compensa dramaturgia rala
PEDRO BUTCHER
CRÍTICO DA FOLHA
O surfe é um esporte de
meio, não de fim. Nele não
há um objetivo em si (o gol, a cesta); o que vale é aproveitar a onda
da melhor e mais bela forma possível. A delícia dos filmes de surfe
está no respeito a essa característica definidora do esporte, um descompromisso com a obsessão
americana do "vencer" e a descrição do simples prazer de surfar.
Mas esse não é o caso de "A Onda dos Sonhos". Distante das comédias de praia, o filme mostra
como o surfe se profissionalizou e
virou uma indústria, trazendo a
reboque a competição, o troféu,
os patrocínios, os prêmios e mesmo a celebridade, numa certa
traição ao seu espírito original.
O filme não só retrata tal traição
como a reproduz em sua estrutura: uma jovem surfista australiana
que mora no Havaí durante os
dias que antecedem sua participação na mais dura competição do
surfe, o Pipe Masters. Nesse meio
tempo, sabemos que ela é filha de
pais negligentes, trabalha duro
como camareira num hotel de luxo e cria a irmã menor; precisa superar o trauma de um quase afogamento do passado e a possibilidade de um romance que só vem
para atrapalhar sua preparação.
É assim que "A Onda dos Sonhos" não se diferencia de outros
filmes americanos esportivos ou
não, ou de qualquer drama da linha "superação de desafios".
Mas a diferença está nas ondas.
O mar se oferece ao espetáculo cinematográfico, e o surfe é um esporte apropriado para a tela grande. Uma câmera presa a uma
prancha leva o espectador para o
mar e o transporta para dentro do
ponto de vista do surfista.
Pois é quando a câmera está no
mar que o longa cresce, pois nesses momentos o surfe e o prazer
da onda prevalecem sobre uma
dramaturgia rala de objetivo pobre: o triunfo pessoal da típica heroína do cinema americano.
A Onda dos Sonhos
Blue Crush
Direção: John Stockwell
Produção: EUA, 2002
Com: Kate Bosworth e Matthew Davis
Quando: A partir de hoje no Metrô
Tatuapé 3, Interlagos 8 e circuito
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