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EUA "MISSÃO: MARTE"
Brian De Palma está perdido no espaço
ELVIS MITCHELL
do "The New York Times"
Como em "Apollo 13", Gary Sinise vê sua equipe indo ao espaço
sem ele. Em "Missão: Marte" (estréia prevista no Brasil em 28 de
abril), ele é Jim, um astronauta
moroso sofrendo com a morte da
mulher, e essa depressão o torna
um candidato pouco plausível para a missão a Marte.
"Ele é bom", explica o comandante Woody Blake (Tim Robbins), "mas não para isso..."
Todos os personagens -o elenco inclui Don Cheadle, Connie
Nielsen e Armin Müller-Stahl, cujo nome não aparece nos créditos- são bons sujeitos, muito
cooperativos -a ponto de serem
difíceis de distinguir uns dos outros. O diretor Brian De Palma os
expõe em perfil nobre com tamanha frequência que você acaba
imaginando quando as moedas
comemorativas serão cunhadas.
"Missão: Marte" decola com estrondo e humor, em meio ao rugido de um foguete lançado aos
céus. Quando ele explode, enche
o céu de confetes e a câmera recua
e mostra um churrasco em um
quintal, onde os felizes astronautas da Nasa discutem a missão
iminente a Marte.
De Palma adora dançar com os
recursos do cinema e demonstrar
que qualquer movimento, de um
rodopio rápido a um arabesco
atlético, pode ser realizado imediatamente com uma câmera.
Mas, dessa vez, parece ter perdido
sua capacidade de misturar climas. "Missão: Marte" é um apelo
à compreensão, um pedido de irmandade. É um monumento da
nova era à moda de "Contato", de
Robert Zemeckis, um filme sobre
o contato com inteligências extraterrenas, mas, em termos emocionais, De Palma está perdido no espaço.
"Missão: Marte" poderia ser o
"O Segredo do Abismo" de De
Palma. O filme de James Cameron, por sua vez, era uma tentativa marítima de retomar os temas
de "2001: Uma Odisséia no Espaço", de Stanley Kubrick, de um
ponto de vista benévolo. Em "O
Segredo do Abismo" , uma inteligência alienígena estende ao homem o tentáculo da amizade.
De Palma dispara rumo ao espaço tendo objetivo semelhante,
acompanhado por um grupo de
escritores que inclui Graham
Yost, de "Velocidade Máxima", e
outros roteiristas com experiência de produção, como Ted Tally
("O Silêncio dos Inocentes") e
David Goyer ("Blade"), ainda que
boa parte do filme pareça ter sido
concebida pelo diretor. Não seria
preciso tanta gente para conceber
diálogos como "mas um desgaste
dessa dimensão jamais foi testado
no espaço!"
Já fez muito tempo que um cozido tão grandiloquente de majestade e burrice se recusa a decolar
na tela grande: provavelmente
desde "O Segredo do Abismo", no
qual o maior desejo de James Cameron era provar às platéias que
ele não era apenas um diretor de
filmes de gênero. O dom de De
Palma é sua capacidade de adaptar os rígidos limites dos gêneros
às suas necessidades, inflando o
conteúdo dos filmes de aventura
até que você exploda em gargalhadas ou se sinta a um só tempo
comovido e apavorado.
Ele já foi acusado de ser inexpressivo, mas o problema com esse filme é seu fascínio completo
pelo tema. Há um clima de sonho,
de "saia à procura de sua felicidade" que não cairia mal em um seminário de auto-ajuda de Deepak
Chopra ou em um disco do Mannheim Steamroller.
A direção de arte é espetacular, e
as cenas passadas na superfície de
Marte parecem tão reais que é como se tivessem sido filmadas em
locação. Uma sequência holográfica detalhando a ligação evolutiva entre a Terra e Marte é brilhantemente encenada. Mas mesmo
nesses momentos, o filme sofre
devido ao emocionalismo piegas,
muito pouco característico de seu
trabalho, que De Palma exibe. Ele
chega a usar um alienígena padronizado, longilíneo e frágil e
agrava o clichê ainda mais quando uma lágrima solitária rola pelo
-bem, acho que o nome tem de
ser rosto- do ET e lá se deixa filmar, brilhante, num momento de
emoção barata.
O filme todo, aliás, não oferece
qualquer originalidade, e a trilha
sonora é repetitiva a ponto de parecer ter sido obtida por download direto da "EnnioMorricone.com". Toda essa esforçada sinceridade deriva da tentativa baldada de criar um senso de emoção reverente nos adultos, derivada da redescoberta de sua humanidade por Jim quando ele é recrutado, mais tarde, para comandar uma missão de resgate.
A paciência pensativa de Sinise,
nessa situação, o faz parecer um
pouco paradão, ainda que não
tanto quanto o filme, que em termos narrativos parece estar acontecendo num ambiente de gravidade zero, e cada minuto parece
durar pelo menos 90 segundos.
No espaço, ninguém ouve os roncos.
Nos EUA, "Missão: Marte" tem
a classificação PG (orientação paterna sugerida). Inclui diálogos
adultos e cenas de violência.
Tradução Paulo Migliacci
Filme: Missão: Marte (Mission to Mars)
Diretor: Brian De Palma
Produção: EUA, 2000
Com: Gary Sinise (Jim McConnell), Tim
Robbins (Woody Blake), Don Cheadle
(Luke Graham), Connie Nielsen (Terri
Fisher), Jerry O'Connell (Phil Ohlmyer),
Peter Outerbridge (Sergei Kirov), Kavan
Smith (Nicholas Willis), Kim Delaney
(Maggie McConnell) e Armin Müeller-Stahl (diretor da Nasa)
Roteiro: Jim Thomas, John Thomas e
Graham Yost, baseado em história de
Lowell Cannon e dos irmãos Thomas
Equipe técnica: direção de fotografia
de Stephen H. Burum;editado por Paul
Hirsch; música de Ennio Morricone;
direção de arte de Ed Verreaux; produção
de Tom Jacobson, David Goyer, Justis
Greene, Jim Wedaa e Ted Tally;
distribuição Buena Vista International
Duração: 113 minutos
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