São Paulo, sexta-feira, 17 de março de 2000


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TRILHA SONORA
Único defeito é não estar à venda

CARLOS BOZZO JUNIOR
especial para a Folha

Já de cara, o CD que traz a trilha sonora do filme "Hans Staden", do diretor Luiz Alberto Pereira, apresenta seu maior e único defeito: não será comercializado. Quem tem, tem.
Quem não tem, jamais terá, a não ser que o surrupie ou que o receba, ofertado por algum desatento proprietário dessa preciosidade, parcamente distribuída como parte do material de divulgação do filme.
A cantora Marlui Miranda e o músico Lelo Nazário são os responsáveis pelas 26 faixas, que mostram algumas formas vocais e sonoras relacionadas ao universo indígena.
Seu ineditismo, que começa pela música tema baseada num motivo de um canto de antropofagia, fez, provavelmente, com que este trabalho tenha abocanhado o prêmio de melhor trilha sonora do Festival de Brasília, no ano passado.
Há no CD, entre outras coisas, uma tentativa de reconstituir o que o alemão Staden talvez tivesse escutado, quando foi capturado pelos índios tupinambás.
Para isso, Marlui se baseou em músicas que funcionam em rituais semelhantes aos descritos pelo viajante europeu, além de composições que mesclam elementos musicais atuais e letras em tupi meridional, com um caráter inspirado nos fragmentos deixados por Jean de Léry.
No entanto, o CD não é apenas uma reconstituição de uma época longínqua. Em sua sonoridade percebe-se o confronto das duas culturas, a européia e a indígena, de maneira melódica, delicada e extremamente encantadora, sem nunca deixar de ser funcional.
Apesar dos muitos elementos indígenas serem maciçamente preponderantes aos europeus, Miranda atinge um equilíbrio sonoro característico de quem sabe o que, e para que, está compondo.
Suas vinhetas convencem e satisfazem a quem assiste ou não ao filme: funcionam mesmo desvencilhadas da película.
As flautas de Teco Cardoso, o oboé de João Cuca, as vozes do elenco e do Coral Vrap, embalados pelos bem escolhidos timbres dos teclados de Nazário, lembram a qualidade peculiar que sempre acompanha os trabalhos do compositor japonês Ryuichi Sakamoto.
Quanto à voz de Marlui, são outros quinhentos. Não 500 anos, mas 500 milênios, pois ela consegue a projeção e a autenticidade de quem sempre consegue encontrar nos índios seus verdadeiros ancestrais. Trilha sonora assim, sim.


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