São Paulo, sexta-feira, 17 de março de 2000


Envie esta notícia por e-mail para
assinantes do UOL ou da Folha
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

9º FESTIVAL DE TEATRO DE CURITIBA
Inspirada em Shakespeare, a montagem é a única atração internacional que estréia hoje
"Caesar" é realidade dos Bálcãs

VALMIR SANTOS
enviado especial a Curitiba

Em 1991, quando o Teatro Nacional de Craiova, dirigido por Silviu Purcarete, encenou "Titus Andronicus" em São Paulo, a tragédia de Shakespeare sangrava igualmente com o momento histórico: havia dois anos, a Romênia assistia à execução do general Nicolau Ceausescu, ponto final do seu governo totalitário.
Do mesmo Leste Europeu, palco imemoriável de ódio, vingança e genocídio, como registra a história desde o século 14, chega agora a montagem de "Caesar", criação do diretor croata Branko Brezovec -única atração internacional que estréia hoje no 9º Festival de Teatro de Curitiba- inspirada em duas tragédias do bardo inglês, "Júlio César" e "Rei Lear".
"São peças bem próximas da realidade que estamos vivendo nos Bálcãs", acredita Brezovec, 45. Ele dá um exemplo: a oscilação de Júlio César entre os regimes democrático e autocrático espelha o poder na nova/velha ordem mundial. "Com a diferença de que os Júlio César que estão no poder hoje não chegam aos pés da força moral que o personagem de Shakespeare emana."
O mosaico emerge do próprio elenco. São quatro atores da Macedônia, dois da Eslovênia e outros dois da Croácia. Ou seja, as três repúblicas que cortaram o cordão umbilical com a ex-Iugoslávia, em 1991, são representadas em "Caesar" sem resquícios de intolerância religiosa ou tensões nacionalistas.
Apesar da impregnação histórica, Brezovec dispensa o discurso político e recusa-se a professar mensagens. Interessa-lhe, antes, a disponibilidade dos atores para entreter e criar em cena. transitando com naturalidade entre a tragédia, a comédia e a ironia.
Essa fluência na interpretação, segundo o encenador croata, foi uma das características que teria despertado a atenção de Gerald Thomas no ano passado, quando encontraram-se em um festival em Zagreb, capital da Croácia.
Outra preocupação de Brezovec é ressalvar o que ele chama de "multiculturalismo vertical", oposição à massificação horizontal que nivela a cultura pela média (de medíocre). "Há pelo menos 20 anos tenho trabalhado com artistas de várias minorias étnicas, como os ciganos, os albaneses, os turcos", explica.
O encenador não se conforma com o desaparecimento, sobretudo na Europa, de pequenos rituais. Por isso, tenta balizar os sentimentos arcaicos e modernos.
Além de Shakespeare, a peça incorpora textos do dramaturgo alemão Bertolt Brecht, do esloveno Slavko Grum e de dois jovens macedônios, Ognjen Georgievski e Biljana Garvanlieva.


O jornalista Valmir Santos viaja a convite da organização do festival


Texto Anterior: Blues: Flávio Guimarães toca novo CD no Sesc
Próximo Texto: Abujamra volta ao palco
Índice

Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.