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"Outsiders" dos anos 80 voltam a respirar
Ira!
PEDRO ALEXANDRE SANCHES
da Reportagem Local
Dois rótulos costumam acompanhar o Ira!: o de "banda honesta" e
o de "banda radical". Tais rótulos
continuam a definir o quarteto
paulista, embora a pretensão seja
relativizá-los agora, no lançamento de seu oitavo disco, "Você Não
Sabe Quem Eu Sou".
Sobre honestidade, a questão é
de valor. "Ficou esse imaginário
de banda verdadeira, que faz "rock
honesto'. No final, parece que esse
é o nosso mérito. Mas isso não é
qualidade musical!", afirma o vocalista Nasi, 36.
Quanto ao radicalismo, eles próprios confessam comportamentos
extremos na trajetória do Ira!. "A
gente era mais punk, era "fuck
you, brega system' ", diz o baterista André Jung, 36.
"Fomos ao "Chacrinha' num Natal, e queriam que colocássemos
chapéus de Papai Noel. Todo o
rock dos 80 estava no programa,
doía ver um por um colocando o
gorrinho. Dissemos não e nunca
mais entramos na Globo", lembra
o baixista Ricardo Gaspa, 39. "Foi
um anticlímax. A gente é bom em
anticlímax", ri o guitarrista e vocalista Edgard Scandurra, 36.
"Tudo era muito ensaiadinho,
não admitíamos mudar nada. Éramos elitistas, não tocávamos músicas de ninguém. As outras bandas falavam bem da gente, e nós
nada", lembra Jung.
Aí a sombra da mudança se intensifica. O novo CD contém releitura de "Miss Lexotan 6mg Garota", do gaúcho Júpiter Maçã,
egresso também dos 80. A faixa
devolveu o Ira! a certas paradas
-está há cerca de dois meses em
primeiro lugar na rádio roqueira
Brasil 2000.
Embora se refiram aos radicalismos com ressalvas, parecem admitir que deles resultou um histórico coerente ao Ira!. É Scandurra
quem define: "Tivemos sempre
comportamento underground,
mesmo que tenhamos ficado populares no histórico dos anos 80".
Mudança e conciliação
No meio do caminho do Ira!,
houve a saída da multinacional
WEA, em 93, quando a banda se
viu sem gravadora.
"Fomos a primeira banda de
rock a ir de uma grande gravadora
para uma menor. Outras encarariam essa "queda de padrão'. Isso
nos distinguiu", afirma Nasi.
Hoje, afirmam tentar conciliar
radicalismos, até porque divergem os interesses de cada integrante da banda -em projetos solo, Nasi tem pesado a mão no
blues e Edgard, no tecno.
"Há um lado crítico de identidade entre eles. Mas conheço os caras, vejo um tomando papel oposto ao que tomou antes. Em 82, Nasi queria fazer hip hop e Edgard só
queria sixties", lembra Jung. "O
Ira! é a quintessência de tudo, passeia por tecno, surf, samba..."
Nasi e Scandurra entram na fogueira. "Achei legal a entrada de
Edgard na tecnologia. Não deixa
de ser uma continuidade do hip
hop, como eu queria fazer antes",
diz o vocalista. "O hip hop não dava espaço para a guitarra, como o
tecno hoje não dá vez para o vocal", devolve o guitarrista.
A surpresa, em 98, é Scandurra
ter convencido os colegas "radicais" a incursionar pelo tecno.
"Chegar a um consenso foi complicado, mas ninguém estava com
a menor vontade de fazer mais um
disco de garagem", define Jung.
O agente flexiblizador, no caso,
não se mostra plenamente satisfeito. "Acho que este é um disco de
transição", diz Scandurra. Ele defende a coerência de ter partido do
mod (movimento roqueiro inglês
dos 60, liderado pela banda The
Who) e chegado ao tecno.
"Mod hoje é o tecno, são as raves, que juntam pessoas com identidades em comum. O grunge era
largado, podrão, machista. As raves trazem de volta o mod, a tolerância, a preocupação estética."
Gaspa ironiza: "Edgard ainda é
tão mod por dentro que precisa se
convencer que o tecno é mod".
Jung apimenta: "Se Pete Townshend (The Who) disser que tecno
não é legal, ele não dorme mais".
O resto do Ira! abre a guarda, no
entanto. O veterano underground
Loop B participará nos shows que
apresentarão o novo disco, em
maio. "Será um quinto elemento
que vai agregar influências eletrônico-industriais", explica Jung.
Todos, enfim, admitem o arejamento do Ira! versão 98. "O CD
contempla passado, presente e futuro", diz Nasi. "É o Ira! olhando
para o futuro", radicaliza Scandurra. "Assim não vira museu, cover de Ira!. Não somos mais o rock
dos 80, somos dos 90", fecha Jung.
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