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Experimentalismo areja som da banda
da Reportagem Local
"Você Não Sabe Quem Eu Sou" é
o disco mais experimental e ousado do Ira! desde "Psicoacústica"
(88). Aquele foi o mais criativo álbum da banda, este chega perto.
Se uma das marcas determinantes da longevidade do Ira! -mesmo com todos os percalços da
aceitação parcial pelo mercado-
tem sempre sido sua coerência, esses são seus dois álbuns "rebeldes", por se desviarem dos modelos rígidos de (bom) rock'n'roll
que o grupo definiu a partir de 85.
Não há dano de coerência, ao
contrário. "Psicoacústica" e "Você
Não Sabe Quem Eu Sou" dão ar e
frescor ao rock da banda brasileira
que mais sabe fazer rock. E mostram que rock não é, necessariamente, coisa a fazer de olhos, ouvidos e narizes tapados.
Se o apreço de Nasi pelo hip hop
dava o tom de "Psicoacústica",
aqui as influências tecno de Edgard Scandurra permeiam a parede pesada do som Ira!. O CD é
muito rock'n'roll, mas há vento e
disponibilidade nutrindo cada um
dos integrantes da banda.
O que vai se perdendo é aquele
tom juvenil, ativista e revoltado
dos rapazes, que antes rendeu
clássicos como "Núcleo-Base" e
"Dias de Luta". Aqui, tal tom só
aparece na letra minimalista de
"Justiça Militar Justiça Civil", que
só faz repetir, entre muitos samples: "Justiça militar, justiça civil".
É, paradoxalmente, a faixa mais
tecnológica do CD, em que faz par
com a divertida e sintetizada "Descendo o Mississippi". Parece um
prodígio, mas o Ira! sabe fazer
parque de diversões no mais avançado espírito noventista.
Fora isso, os rocks vão se sucedendo num inferninho estimulante de ruídos e efeitos estranhos, já
a partir de "Às Vezes de Vez em
Quando" (de Scandurra) e "Correnteza" (de Nasi, Gaspa e do anti-herói Ciro Pessoa), que abrem
com ira o CD.
Mas o ápice, lado a lado com a
seção tecno-rock, se encontra
mesmo em "Miss Lexotan 6mg
Garota", esfinge psicodélica que
devolveu o Ira! às paradas não-jabazeiras do rádio nacional.
A composição é do gaúcho Júpiter Maçã, ex-Cascavelettes, outro
oitentista convertido à modernidade dos 90 (prestes a ser lançado
nacionalmente pela PolyGram). É
quando Ira! consegue ser tão mod
quanto quando reclamava que
"Ninguém Entende um Mod"
-um delírio aos saudosistas.
Para esses há também "Eu Não
Sei", versão de Roger (isso mesmo, aquele do Ultraje a Rigor) para "I Can't Explain", do Who. A
cover é mod, muito mod, mas
mostra como o Ira! mudou -a
roupagem é contemporânea, subversiva, diferente das releituras
anteriores de Animals e Stones.
Bem, e há, afinal, as baladas de
Scandurra -sim, o fervoroso defensor de raves ainda toca guitarra
e compõe temas tranquilos como
ninguém entre os de sua geração.
Os exemplares aqui são "Tantas
Nuvens" (antes presente em "Benzina", álbum solo de 96 de Scandurra), em que reaparece a frase
mítica do Ira!, "então eu canto esta
canção...", e, especialmente, na
dramática faixa-título.
A fórmula parece simples, e é
oposta à que eles mesmos prescreviam na irônica "Receita para Se
Fazer um Herói", de "Psicoacústica": não fique rico, faça a música
que você mais gosta, resista às
pressões e procure evoluir -seu
currículo não será muito menos
que exemplar. Anti-heróis dos 80,
os meninos do Ira! já integram
uma banda atemporal.
(PAS)
Disco: Você Não Sabe Quem Eu Sou
Banda: Ira!
Lançamento: Paradoxx
Quanto: R$ 18, em média
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