São Paulo, quarta-feira, 17 de maio de 2006

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MÔNICA BERGAMO

Ana Ottoni - 31.ago.2004/Folha Imagem
"Me deu um ataque de fúria", diz Attílio Baschera, que está convocando um protesto pela paz nas ruas


Meu dia de periferia

O high society paulistano viveu seu dia de periferia na segunda-feira, 15. Toques de recolher espontâneos, bandidos por perto, pânico nas ruas. Foi um choque.

 

"Me deu um ataque de fúria", diz Attílio Baschera, dono de um antiquário e figura das mais queridas do circuito Jardins/Higienópolis/Morumbi. "São Paulo vai virar o quê, uma Bagdá?". Indignado, Attílio passou e-mail a 50 amigos conclamando todos para um protesto. "Se podemos fazer passeata gay na avenida Paulista, se podemos permitir também vandalismos depois de jogos de futebol, na mesma avenida, por que não podemos organizar uma grande passeata de protesto contra a corrupção e ineficiência de nossos dirigentes?!?!?!".

 

Até ontem, o resultado da iniciativa não tinha sido muito animador: ninguém havia aderido à possível passeata. Rosângela Lyra, que comanda a Dior no Brasil, por exemplo, repassou o e-mail a amigos e embarcou para Nova York.

 

Attílio não desanima. "É um pensamento meio revolucionário: precisamos aguçar, chacoalhar as pessoas para uma atitude mais drástica", diz ele, que ainda sonha em "colocar 2 milhões de pessoas na Paulista".

 

Uma locadora de veículos em Moema informava que quase dobrou o número de locações de carros blindados de luxo na segunda: passou de cinco (a média normal) para nove. Os modelos mais procurados foram o Passat e o Omega -a 1.000 cada 24 horas.

 

A rotina de festas nos bairros nobres se alterou de forma radical. Às 16h da segunda, com 40 rebeliões em curso em presídios e dezenas de pessoas morrendo nas ruas, o consultor de etiqueta Fábio Arruda concluiu que o melhor a fazer era adiar a festa de seu aniversário, que seria comemorada em um restaurante dos Jardins. "A cidade estava um caos e era a hora do "dá ou desce". Resolvi descer, para não começar a chorar. Desmarquei a festa. Não havia clima!"

 

Arruda foi à luta. "Armei uma pequena operação de guerra", diz. Ligou para socialites como Betty Szafir e Cecília Neves e pediu ajuda para avisar os 200 convidados de que naquele dia não teriam festa. "O problema é que muitos celulares não funcionam. Está um inferno!", desabafava ele, no meio da operação-desmonte. "A meia dúzia que eu avisei me disse que já não ia mesmo, porque estava com medo", diz a amiga Betty Szafir, que passou o dia trancada em casa, nos Jardins.

 

E lá se foram para o lixo os 40 arranjos de orquídeas que decorariam a festa de Arruda, assim como grande parte do "arroz de puta rica", recheado com frutos do mar. As garrafas de champanhe, que já estavam no gelo, foram salvas -ficarão para a próxima segunda, para quando foi transferida a comemoração.

 

Já os 36 kg de patê (fígado, "egg salad", coalhada) seriam jogados fora. "Não dá para guardar. Vai estragar!", desabafava Arruda. "Pedi dois motoristas emprestados de minhas amigas para levar os docinhos [são 1.600, fora o bolo de oito quilos] para instituições de caridade." Outro problema: "Trouxe para o restaurante 350 hipopótamos [bonecos de vários tamanhos, de sua coleção particular]. Precisei de um caminhãozinho e agora terei que levar tudo de volta!"

 

Eram também 16h quando, no Alto de Pinheiros, o arquiteto Marcelo Faisal, também com festa de aniversário marcada, deu a ordem: "Cancela tudo!". "Realmente, hoje não é dia de festa, né? É um dia triste", comentava com a coluna, por telefone, interrompendo para atender o celular: "Oi, Dé! Cancelei, tá? É... Vamos marcar para quinta-feira".

 

"Tô" exausto de ficar ao telefone! Imagina, desmarcar com 150 convidados. É super desagradável!", dizia. "E o "TV Fama" vinha, o [apresentador da TV Gazeta] Rammy vinha... É muito chato", contava Faisal. E, atendendo outro "desconvidado" ao celular: "Quero fazer a festa na quinta. Mas vai depender desse estresse da cidade".

 

O prejuízo "é pequeno, mas existe", segundo Faisal. Dos 72 litros de sopa e macarrão, grande parte seria jogada fora. "Estou superchateado". As guarnições da massa, como o champignon de Paris, foram levados por funcionários, que, sem ônibus, partiram para a casa nos carros do bufê.

 

Foram dezenas de eventos cancelados. O promoter Cacá Ribeiro, um dos organizadores da inauguração do Salão de Festas da Casa Cor, no Jockey, adiou sua festa. "Super chato, né? O problema é que, em uma festa grande, para 1.500 pessoas, não dá para desconvidar todo mundo. Então colocamos umas duas ou três pessoas na porta do Jockey". Quem chegava recebia o aviso de cancelamento e um docinho como consolo.

 

Foram distribuídos para funcionários ou jogados no lixo os 30 arranjos de orquídeas e as dezenas de bem-casado.

CURTO-CIRCUITO

O antropólogo Rodolfo Guttilla lança hoje, às 18h30, o livro "A Casa do Santo & o Santo de Casa", na Livraria da Vila.
O bar Mosteiro de San Galo será inaugurado hoje, a partir das 20h, na Vila Madalena (rua Harmonia).
José Roberto Auriemo inaugura hoje outra unidade do "The Fifties", com projeto de Sig Bergamin, na Vila Olímpia.
A Gradiente e a TVA fazem hoje, às 19h30, o coquetel de inauguração do espaço HDTV, no shopping Iguatemi.
Bob Yang inaugura hoje, às 20h, o bar Baleares, espaço lounge com restaurante, na rua Bela Cintra.



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