São Paulo, Sábado, 17 de Julho de 1999
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TEATRO
"Le Colonel-Oiseau", uma das preferidas no Festival de Avignon, aborda Bálcãs em mensagem otimista
Peça "enxerga" a Bulgária em hospício

HAROLDO CERAVOLO SEREZA
enviado especial a Avignon

Uma das peças mais festejadas do 53º Festival de Avignon, "Le Colonel-Oiseau" ("Coronel Pássaro") trata do mais grave problema político que a Europa enfrenta hoje: os conflitos nos Bálcãs.
A mensagem pacifista -e parcialmente otimista- fez da peça uma das preferidas, por exemplo, do diretor do festival, Bernard Faivre d'Arcier. Ele afirma que "Le Colonel-Oiseau" devolve o prazer do teatro. Conta para isso também um uso de um palco rotativo que, se não chega a ser original, é bastante coerente, com resultados fortes e, claro, com um bom-mocismo não igualado pelas colegas de festival.
Dirigida pelo francês Didier Bezace, o texto de Hristo Boytchev (Bulgária) conta a vida num hospital psiquiátrico búlgaro, sediado num antigo monastério.
Um jovem médico chega ao hospital com a promessa de um futuro profissional promissor e se descobre totalmente sem recursos: não há enfermeiras, não há remédios, não há nem comida. Passa a viver com todas as privações, entre seus pacientes. De certo modo, é um pequeno retrato da própria Bulgária, país espremido entre a Iugoslávia e a Turquia.
Cada louco com a sua mania, brinca o ditado. A mania de um deles é se dizer surdo e "ler os lábios" do noticiário da TV, que não tem som. Todos os dias, conta a mesma notícia, com poucas adaptações: um grupo sérvio ataca tropas da ONU nas redondezas de Sarajevo, na Bósnia. As Nações Unidas decidem, então, enviar a ajuda humanitária por avião.
Quando o médico já se acredita totalmente impotente, um pára-quedas com ajuda humanitária destinado aos bósnios cai na área do hospital. Ninguém sabe a razão do erro, mas as fardas do lote têm um efeito inesperado -um dos pacientes, até então mudo, passa a se dizer coronel e a organizar os outros pacientes.
O grupo ganha cargos, obrigações e coerência. O médico deixa a "experiência" seguir. Num ritmo crescente de organização, eles decidem formar uma nova República e se alistar nos batalhões de ajuda humanitária da ONU.
Para comunicar a decisão, pensam em utilizar o telefone do médico. Este, porém, "entra" na lógica dos pacientes -o telefone deve estar grampeado. A saída é enviar mensagens para ONU, Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) e UE (União Européia) amarradas nos pés dos pássaros.
A resposta, no entanto, não vem. Quando o coronel já está desacreditado, um dos pacientes encontra um pássaro com uma etiqueta metálica típica de pesquisas ornitológicas.
O coronel, no entanto, a entende como uma mensagem -o 0101 gravado significa que eles devem partir em direção a Estrasburgo (sede do Parlamento Europeu) no dia 1º de janeiro.


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