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VOZES SOLITÁRIAS NA VENEZUELA
Grupo de ska Desorden Público critica atitude dos dois lados na crise do país vizinho
"É um caos em que não se enxerga solução"
SHIN OLIVA SUZUKI
DA REDAÇÃO
A ligação das palavras "Desorden Público" à Venezuela evoca
quase imediatamente as imagens
da barafunda política por que
passa o país, notavelmente as que
reproduzem os distúrbios ocorridos nas ruas da capital Caracas.
Até há pouco tempo, porém, esse vínculo residia no nome do
grupo mais expressivo do cenário
musical venezuelano recente, responsável por uma bem-sucedida
junção do ska (gênero que deu
origem ao reggae) a ritmos latinos
de acento caribenho, como a salsa
e a cumbia. Mas, de qualquer forma, não é longa a distância entre o
Desorden Público e as questões
mais prementes de seu país.
Criado em 1985 por dois ex-DJs
influenciados por sons jamaicanos e pelo punk, o grupo se evidenciou a partir dos anos 90 por
mesclar sua musicalidade festiva
a uma fina ironia e bem-humoradas críticas dentro das searas política e econômica. Exemplo da
música "Molotov Love", lançada
em 1997, em que a banda brinca
com a relação de países emergentes com o mercado financeiro, este simbolizado por uma desejada
mulher cuja conquista é possibilitada seguindo os conselhos
"amorosos" do Fundo Monetário
Internacional.
O atual status da crise venezuelana não abre muito espaço para
chistes de primeira hora. É o que
se nota no tom do baixista e fundador do Desorden Público, José
Luís "Caplís" Chacín, quando comenta à Folha, falando de Caracas, os embates entre o governo
Hugo Chávez e a oposição.
"O que está ocorrendo é um
caos em que não se vislumbra solução", afirma.
No meio do fogo cruzado, como
está o grosso da população venezuelana, Caplís enxerga críticas
para os dois lados: "Não sou partidário de Chávez porque há atitudes patéticas de sua parte, como
estar armando as pessoas nos
bairros. Há um grande temor por
parte do governo de perder o poder, então parece que a maneira
mais fácil de assegurar o seu poder por muito tempo é fornecendo armas para quem não sabe
nem manejar um revólver".
"Há também uma grande culpa
dos meios de comunicação. Eles
já se converteram em meios propagandísticos da oposição, não
estão cumprindo o seu papel de
independência", diz. "E me pareceu algo cruel e estúpido quando
os comerciantes, em nome da greve, fecharam as portas justamente
em dezembro, o mês de maior
movimento. Uma estratégia tão
cega de ódio que não importava
que quebrassem, contanto que
Chávez saísse do poder", refere-se
Caplís à greve organizada pela
oposição ao governo, que terminou há cerca de duas semanas.
Música
O último lançamento do Desorden Público foi o disco "Diablo"
(2000), que sai agora no Brasil pelo estreante selo independente
Radiola Records. Mas a banda
não ficou indiferente ao que se
passa no país e compôs a canção
"Mirándonos", que está disponível pela internet no site www.desordenpublico.net, cuja letra reflete em parte o pensamento do
baixista Caplís ("tanta é a luta/
que não nos demos conta/ que nada fica depois de um naufrágio/ só
pedaços flutuando/ à deriva no
mar").
Com o lançamento de "Diablo"
por aqui, Caplís revela que é intenção do grupo passar pelo país
para uma turnê, sedimentando a
ligação iniciada desde o trabalho
com o produtor brasileiro Carlos
Savalla (Paralamas do Sucesso)
em "Canto Popular de la Vida y
Muerte" (1994), grande sucesso
na América hispânica.
"Sempre fomos fãs de seu trabalho e devemos a ele o fato de termos passado de um grupo de adolescentes para ser um dos
principais projetos musicais da
Venezuela", diz o músico.
Sem uma saída à vista para os
problemas do país, é ver se o Desorden Público conservará no futuro a máxima da música "Truena Truena", de "Diablo": "aqui se
sofre a vida gozando".
DIABLO. Artista: Desorden Público.
Lançamento: Radiola Records. Preço: R$
15. Onde encontrar: 0/xx/11/5579-5313
ou radiolarecords@uol.com.br.
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