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ARTES PLÁSTICAS
Colombiano conta que nunca usou modelos obesos para seus quadros e que não exalta gordura, mas volume
Botero diz que não é "pintor das gordas"
Associated Press
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"A Consolação" (2001), de Fernando Botero, uma das raras pinturas do artista com temática social |
DA REPORTAGEM LOCAL
Leia a seguir a continuação de
entrevista com Fernando Botero.
(CASSIANO ELEK MACHADO)
Folha - O sr. é um dos artistas
mais populares vivos, já fez grandes exposições no mundo todo e teve grande valorização financeira
de seu trabalho. Por outro lado, o
sr. é muito atacado pela maior parte dos grandes críticos e demais
pensadores da arte contemporânea. Como é viver nessa balança?
Fernando Botero - Todos os
grandes pintores da história tiveram de sofrer ataques dos críticos
de sua época. Isso é ainda mais
forte se alguém apresenta, como
eu, algo que é o contrário do que o
estabelecimento cultural decide
que deva ser a arte. Todos dizem
que a pintura deve ser bidimensional e não deve ter tema, que a
arte agora são instalações cheias
de vídeos. Faço o oposto. Nado
contra a corrente e não me importo. Tenho muitas críticas negativas, mas ao mesmo tempo sou o
artista vivo com mais mostras nos
grandes museus do mundo, mais
do que o dobro dos outros. Os diretores dos museus também são
críticos e eles sempre me convidam para expor. O importante
para mim é que minha obra tenha
cada vez mais repercussão e mais
público e, agora, com o documentário, ficará ainda mais conhecida, sobretudo na América Latina.
Folha - O documentário cita sua
participação como o representante
da Colômbia na 5ª Bienal de São
Paulo, em 1959. Qual foi a importância dessa exposição para a sua
carreira, que na época começava?
Botero - Foi minha primeira
grande exposição internacional.
Mas eu não estava na Colômbia
quando aconteceu essa famosa
Bienal, e os quadros que o governo escolheu não eram os que queria. Então não fiquei muito contente. Essa Bienal foi curiosa, pois
foi uma das únicas grandes exposições coletivas de que participei.
Nunca fui amigo das coletivas.
Fiquei muito satisfeito no Brasil
com minha mostra no Museu de
Arte de São Paulo (98).
Folha - A publicidade dessa exposição aqui foi em cima da obesidade dos protagonistas de seus quadros ("venha ver uma "Mona Lisa"
gordinha"). Como o sr. lida com essa leitura de sua obra?
Botero - Os que não entendem
nada dizem que Botero é o pintor
das gordas. Isso não me incomoda. Mas, se as pessoas olhassem
minha obra com atenção, veriam
que a deformação volumétrica
que faço em uma natureza-morta
é a mesma que uso em pessoas ou
paisagens. Faço uma exaltação do
volume, não da gordura.
Folha - Como os gordos recebem
seu trabalho?
Botero - Acho que se identificam. Ouvi falar até de uma cadeia
de restaurantes de comida dietética que são decorados com reproduções de minhas obras [risos".
Não me importo, acho simpático.
Folha - O sr. já usou modelos obesos para as suas pinturas?
Botero - Nunca. É um trabalho
de imaginação. Não poderia jamais conseguir uma modelo com
as proporções que eu pinto. Mas
há uma senhora amiga minha que
é muito gorda, gorda mesmo. Eu
sempre a convido para jantar.
Quando as pessoas nos vêem,
sempre acham que estou jantando com uma modelo minha.
Folha - O que o sr. acha do trabalho do artista suíço Alberto Giacometti (1901-66), que só fazia esculturas bem longilíneas, "magras"?
Botero - Sou interessado por artistas com estilo e intenções bem
definidos. Arte pede coerência.
Giacometti é coerente e de claridade extraordinária. Odeio artistas que fazem de tudo. Arte é como política. Há de ser de direita
ou de esquerda. Centro não conta.
Folha - E como o sr. se define?
Botero - Artisticamente, sou só
um pintor figurativo. A arte, hoje,
é mais uma história de personalidades do que de movimentos. É
uma aventura individual.
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