São Paulo, quinta, 18 de junho de 1998

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ARTES PLÁSTICAS
Beth Moysés discute o feminino

FERNANDO OLIVA
da Redação

O feminino que Beth Moysés traz hoje para a galeria Thomas Cohn vem despido de delicadeza e resume o lado cruel de um romantismo corroído pelo tempo.
A matéria-prima que elegeu, os vestidos de noiva, símbolo mítico de valores ideais para a mulher, compõe dez objetos escultóricos e uma instalação.
Os vestidos são velhos conhecidos de Beth, que reutiliza os objetos desde 94, e são cedidos por amigas da artista, que optaram por se desfazer ou emprestar outro sentido a um objeto pessoal que possui forte carga emotiva.
Na instalação, forram o chão do vão livre da galeria, criando um espaço para a memória pública de muitas desilusões e fracassos do passado. Descalço, o público pode andar sobre eles.
Nenhum dos vestidos que compõem a instalação sofreu algum tipo de transformação -não foram nem lavados, mostram-se ao público da maneira como foram entregues pelas noivas.
O tempo passou para os vestidos e para quem um dia os ocupou. Memória de épocas perdidas, de um ritual de passagem que teve seu significado corrompido pelo tempo, os tecidos são destrinchados por Beth e reutilizados para construir seus objetos-esculturas.
O estranhamento causado pelas peças pode estar no embate entre a delicadeza dos bordados revestindo objetos de outras categorias -como a luva de boxe ("Luta") ou a roda de bingo ("Jogo").
A luva, decorada com bordados e falsas pérolas, estufada com véus, reúne delicadeza e agressividade, embate recorrente no trabalho de Beth Moysés.
As obras não apontam saída possível, remetem a um passado que, apesar de ter deixado suas lembranças palpáveis, foi definitivamente enterrado. Não sobra espaço para a nostalgia, e a lembrança é amarga. Nesse sentido, são de uma crueldade rara.
Corpo
Os vestidos não são apenas metáfora de uma feminilidade perdida, mas também uma extensão do corpo -ou, simbolicamente, o próprio corpo.
O corpo é a base da obra da fotógrafa Marta María Pérez Bravo, que também expõe na mesma galeria a partir de hoje.
A artista cubana, uma das mais importantes fotógrafas contemporâneas de seu país, simula ícones religiosos usando o próprio corpo como matéria-prima.
Os retratos de Marta fazem a ligação entre a atuação individual da artista, sua auto-representação, e a cultura popular cubana, sua iconografia religiosa e mitológica.

Mostra: Beth Moysés e Marta María Pérez Bravo Onde: galeria Thomas Cohn (av. Europa, 641, tel. 011/883-3355) Vernissage: hoje, às 20h Quando: seg a sex, 11h/19h; sáb, 11h/14h Quanto: entrada franca Preço das obras: R$ 2.500 a R$ 8.000 (Moysés); R$ 1.000 a R$ 1.200 (Bravo)


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