|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
MÚSICA/LANÇAMENTOS
"MARICOTINHA AO VIVO"
Cantora estréia na gravadora Biscoito Fino
Bethânia independente apela para a mesmice
DA REPORTAGEM LOCAL
"Maricotinha ao Vivo" é
um marco histórico na
carreira de Maria Bethânia, 56, e
na da própria música popular
brasileira. É a estréia no mercado
independente da cantora baiana
(e, por tabela, da MPB de ponta).
Ela saiu da multinacional BMG
e se lança agora, com um disco
duplo ao vivo, pela Biscoito Fino,
gravadora exclusivamente nacional e de porte pequeno, embora ligada ao poderio do banco Icatu.
O significado dessa transição
ainda é pouco claro, mas, colado
às eleições, faz voarem pensamentos em duas direções distintas. O fenômeno seria comparável
ao dos apuros de caciques "eternos" da política brasileira nas urnas? Ou seria equivalente ao processo de ganho de cacife eleitoral
de nacionalistas e "pequenos"?
Os conceitos divergentes se
confrontam, mas parecem conviver em certa harmonia nas linhas
musicais de Bethânia. A pulsão libertadora fornece ânimo à sua
voz e confirma um tônus que ela
sempre teve -de ser combativa e
enfrentar com peito aberto as oscilações sociais/políticas/musicais
do Brasil.
É o que transforma em festa épica algumas das 50 (!) faixas: o rito
migrante nordestino "Pau-de-Arara", a messiânica "Festa" (de
Gonzaguinha), a "Opinião", de Zé
Keti, as buarquianas "Apesar de
Você" e "Rosa dos Ventos"...
Mas a força contrária está ali
agindo, também. Este é o 13º disco ao vivo de que Bethânia participa. Remete-se diretamente ao
anterior "Maricotinha" (2001), da
BMG. Fica atrelado a ele, como
um CD independente indeciso,
que ainda não o é plenamente.
O disco-show tem direção do
homem de teatro Fauzi Arap, um
mestre na arte do encadear repertório com Bethânia. O brilho de
encadeamento se avulta, aqui, na
sequência em que Bethânia fala
da época em que cantava em boates, sobrepondo a recente "Se Eu
Morresse de Saudades" (Gilberto
Gil) com pilares do maltratado,
mas resistente samba-canção.
Acontece que são muitos e frequentes seus discos ao vivo. Soam
exuberantes em geral, caso deste
também. Mas, um após o outro,
vão evidenciando o que nos saberes da cantora e do diretor há de
cacoete ou estratagema renitente.
Por mais que ânimo e vida extravasem da voz, a ladainha vai ficando abusiva, porque reutilizada
demais. E aí Bethânia periga evocar, mesmo sem querer, os velhos
caciques que repetem discurso
decorado em toda eleição -e hoje convencem menos o eleitorado.
Música não é (só) política, é claro, e por seu conteúdo "Maricotinha ao Vivo" é ainda um CD caloroso de Bethânia. Mas não tem
muito a contar além daquilo tudo
da MPB "de ouro" que segue em
desgaste contínuo. Maria minimiza o momento histórico de sua
viagem corajosa ao mundo "indie". Em vez de entregar a seu público cativo e a eleitorados emergentes um passo realmente novo,
inédito, prefere, por prudência ou
dúvida, estrear batendo ponto.
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)
Maricotinha ao Vivo
Artista: Maria Bethânia
Lançamento: Biscoito Fino
Quanto: R$ 30, em média
Texto Anterior: Crítica: Biógrafo aceita o astro errante em toda a sua incoerência Próximo Texto: Nana Caymmi se rende à obra do pai, Dorival Índice
|