São Paulo, quinta-feira, 19 de janeiro de 2006

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MÔNICA BERGAMO

ELA MORRE HOJE

Ele é o assassino de Bia Falcão

Marlene Bergamo/Folha Imagem
Criador e criatura, Silvio de Abreu, o autor de "Belíssima", vê Fernanda Montenegro encarnar na TV o personagem que escreveu, Bia Falcão, que morre hoje


A coluna descobriu o autor do crime que deve tomar as conversas do país nas próximas semanas. Bem, ao menos o autor intelectual: Silvio de Abreu, 63 anos. Criador do sucesso do horário nobre global com 45 pontos de Ibope médio, ele vê sua novela "Belíssima" (TV Globo) chegar nesta noite a seu capítulo mais trepidante, o acidente que fará Bia Falcão (Fernanda Montenegro) ser dada como morta.
 
A cena já foi gravada. O carro de Bia cai de um barranco, explode, e a polícia encontra um cadáver carbonizado, com as jóias da vilã no corpo. Mas será mesmo que a megera partiu para a suíte presidencial do além? Ou terá armado o próprio desaparecimento em algum plano mirabolante?
 
Só quem tem as respostas é Silvio, que, em sua cobertura com vista para o parque Ibirapuera, talha a história sintonizada diariamente por metade dos lares brasileiros. Ele fez uma pausa em suas 15 horas diárias de trabalho e recebeu a coluna para revelar cenas de sua trabalho -e também para ver a novela com ele.
 
CENA 1 - ELEVADOR DO PRÉDIO
Os botões que indicam os andares se acendem em ordem crescente: "1", "3", "5"... Só há números ímpares, indicando apartamentos dúplex. Do "17", a luz pula para o "20". É o tríplex de Silvio de Abreu.
 
CENA 2 - ESCRITÓRIO
A porta é emoldurada por uma grande estante de livros, lembrando uma passagem secreta. Silvio -camisa rosa, calça creme, sapatos marrons sem meia- gira a maçaneta e apresenta a sala.

Folha - Você aqui, sozinho, cria uma história seguida por dezenas de milhões de brasileiros.
Silvio -
Ah, mas eu não tenho essa noção, não. Se eu olhar por esta janela e pensar que todas essas luzes acesas são TVs de gente me assistindo, fico doido.

Folha - Você pensa na influência que tem sobre o telespectador?
Silvio -
Não me dou esse luxo. Sei que é uma responsabilidade grande, mas não posso escrever a história dos primos que se amam (Mateus e Giovana, personagens de Cauã Reymond e Paola Oliveira) e pensar: "Mas e se primos que moram "lá não sei onde" se influenciarem, forem para a cama, e a menina engravidar?" Aí eu não faço a novela.
 
Silvio descreve sua rotina: diz que acorda às 6h30, toma café com leite de soja e folheia três jornais. Às 7h30, já está no computador. Pára por uma hora para almoço, único horário em que encontra a mulher, Maria Celia, e a filha, Juliana. "Quando durmo, minha mulher já pegou no sono. E vejo a novela sozinho, sem palpites."
 
O apartamento, repleto de centenas de livros e 3.000 filmes, conta com apenas uma empregada. O escritório é organizado. Sobre a mesa, estão empilhadas cartilhas com lembretes sobre a trama, listinhas com palavras em grego e turco para as falas dos estrangeiros. Há também um glossário de gírias, para os diálogos dos personagens jovens: "afinar" -"fugir"; "abalar" - "fazer melhor"; "é dez"-"muito bom".
 
Silvio sublinha as gírias dos jovens pobres com canetinha vermelha e as dos ricos com canetinha azul. "Para uma novela dar certo, você tem que pegar as classes C, D e E. Demos um acabamento "classe A", mas a história é bem folhetinesca. Não pode sofisticar."
 
Quando a novela engrena suspenses, como o que explodirá no capítulo de hoje, Silvio tem trabalho extra: enviar capítulos falsos à produção, para despistar a imprensa. "Faço isso porque tem gente dos bastidores que vende as informações para as revistas. Fiz muito em "A Próxima Vítima". Em "Torre de Babel", inventei uma cena em que a Cláudia Raia e a Silvia Pfeifer se beijavam e saiu em tudo quanto é lugar. Era mentira. [risos]"
 
O alívio na correria vem nos capítulos das quartas-feiras em que há futebol na TV. "A novela fica mais curta e só faço 30 páginas, em vez de 40. Normalmente eu não gosto de futebol, mas aí eu amo", diz ele, que afirma ser, como o personagem Gigi (Pedro Paulo Rangel), um heterossexual de "alma gay".

Silvio - O Gigi gosta de tudo o que gay gosta: teatro de revista, cinema, moda, mas ele não vai para a cama com homem. Ele tem a alma gay, mas não a prática. Quem trabalha com arte -eu, o Carlos Manga, o Daniel Filho- é assim.
Anoitece. E Silvio, assustado, se lembra de olhar para o relógio: passam das 21h.

Silvio - A novela já começou!!
 
CENA 3 - SALA DE TV
Um sofá grande, duas chaise-longue e uma televisão de 60 polegadas compõem o ambiente. Bia Falcão e Mary Montilla (Carmen Verônica) estão em cena.

Bia Falcão - A senhora está brincando comigo?

Mary Montilla - Brincando? Escuta aqui, Bia Falcão! Se eu quisesse brincar com alguém, não ia ser você que eu ia chamar pro meu playground!

Silvio (risos) - Elas são ótimas!

Mary Montilla (pega um documento de Bia) - Me dá isso aqui, sua jararaca descontrolada!

Bia Falcão (pica os papéis e atira na cara de Mary) - Dou! Tome!

Mary - Eu ainda mato você, sua bandida! Mato!!!
Silvio vai às gargalhadas. "Eu faço a novela para mim. Choro, torço, dou risada."
 
Outra cena: a babá Mônica (Camila Pitanga) e o playboy Alberto (Alexandre Borges) no pronto-socorro com o garoto Toninho (Thomas Veloso).

Silvio - É o drama típico de folhetim: o menino doente pedindo ao pai para se casar com a babá. Nada mais "classe C" do que isso! Mas é bem-feito, tem verniz, não assusta a "classe A".
 
Surge na tela Carolina Ferraz, de camiseta e calcinha.

Silvio (com a mão esquerda no queixo) - Hummmm...
 
O capítulo termina, e o novelista terá que voltar ao computador. "Escrevo o dia inteiro, fico semanas sem sair de casa. Até que, lá pelo capítulo cem, me bate um desespero e vou escrever na minha casa do Guarujá, em NY, num hotel, em qualquer outro lugar."

Folha - E quando a novela acaba de vez, qual a sensação?
Silvio -
Um orgasmo. E um vazio. Porque eu sou um deus quando a novela está no ar: posso mandar matar, mandar trepar. Quando tudo termina, eu saio do meu mundinho, vou para a rua e vejo que o mundo não funciona do jeito que eu quero, as pessoas não fazem o que eu mando. No primeiro mês, a vida fica muito chata!

Folha - E quem mata Bia Falcão? Aliás, ela morre mesmo?
Silvio -
A brincadeira é essa. Vocês tentam adivinhar, e eu tento esconder.

FORA DO GANCHO
A Telefônica, co-patrocinadora do show do U2, reservou um lote de 10 mil ingressos (ou 14% do total) para seus empregados -eles têm de pagar pelo convite, mas sem passar pelo sufoco da fila dos outros mortais. Como a venda dos bilhetes tem sido caótica, a coluna apurou que alguns funcionários lucram com a facilidade: vendem o tesouro por até R$ 500.

CRÍTICA MONUMENTAL
Oscar Niemeyer escreve um livro sobre política. Em "Sem Rodeios", o decano arquiteto falará sobre sua relação com o poder e fará avaliações ácidas de políticos que conheceu. O presidente Lula não será poupado.

JOGA PEDRA
A V.Rom arma comemoração um dia antes do próprio desfile no SPFW, neste domingo. O local escolhido é o bar Geni, casarão na rua Bela Cintra, em SP.

APONTAMENTO
E "Budapeste", o filme, sai do papel. A produtora e roteirista Rita Buzzar teve, neste mês, a primeira reunião com Chico Buarque, autor do livro, e Walter Carvalho, diretor, para definir novos rumos para o roteiro do longa e, principalmente, apontar este ou aquele nome para o elenco. A escalação, porém, só começa em março.

O TOTÓ TEM E-MAIL?
As celebridades que pretendem levar seus animais de estimação ao Festival de Cinema de Sundance, que começa hoje, já têm um point: o CesarSpa Dog, na Main Street. Até agora, marcaram horário para seus "filhinhos" a bad girl Kelly Osbourne e os aviões Jessica Biel e Shannon Elizabeth.

CABE MAIS UMA
Um clima de jam session baixou no lançamento do terceiro disco da banda Mantiqueira, anteontem, no Bourbon Street, em SP. Mônica Salmaso, na platéia, atendeu ao coro insistente dos espectadores, que pediam sua presença em cena. Com Proveta no sopro e Guello no pandeiro, ela cantou "Minha Palhoça". Subiu ao palco também a cantora e pianista Tânia Maria, que foi de "Linha de Passe" com o grupo instrumental.

BANDEIRA PAULISTA
O aniversário de São Paulo ganha lado gay. A prefeitura está fechando com Beto Lago, do Mercado Mundo Mix, e André Hidalgo, da Casa de Criadores, o "Bulevar São João". O calçadão no final da avenida do centro recebe a partir do dia 25 uma série de eventos, mensais a princípio, voltados ao público GLS.
 
O primeiro é um concurso da drag queen mais bonita. A vencedora, dentre as 40 inscritas até agora, representará o município em eventos como o Carnaval.

SÉRGIO DÁVILA (interino)

@ - sdavila@folhasp.com.br
@ - bergamo@folhasp.com.br

COM JOÃO LUIZ VIEIRA E DANIEL BERGAMASCO

CURTO-CIRCUITO

Estão abertas as inscrições para o cursinho pré-vestibular gratuito da Acepusp, associação cultural ligada à USP. Informações pelo telefone (11) 3258-1436.
A Expand inicia amanhã venda promocional de 2.000 rótulos de vinho, com preços de R$ 7 a R$ 8.880.
Giuliana Romano promove em seu ateliê, na rua Capitão Antônio Rosa, venda especial de sua grife.
Gabriel Nehemy celebra hoje seus 27 anos, com festa para 150 amigos no Figa, na rua Amauri, no Itaim Bibi.


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