São Paulo, Sexta-feira, 19 de Março de 1999
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Líder desaparecido assombra a banda

Divulgação
Richey James, ex-líder do Manic Street Preachers, mostra o '4 Real' que ele talhou em seu braço com uma gilete



da Redação

Morto ou apenas desaparecido, o nome de Richey James continua a assombrar o Manic.
Colega de Nicky Wire na faculdade de história e amigo de infância dos outros membros da banda, Richey se uniu à banda em 1989.
Sua participação era centrada nas letras, em parceria com Nicky, e no design das capas dos discos e singles do Manic. Adotava um estilo glam quando Brian Molko (do Placebo) ainda usava calças curtas (ou saiotes, como queiram).
Sua atitude mudou a cara do Manic na mídia. Considerado inicialmente um bando de intelectualóides socialistas que imitava o Clash, o grupo deve à esquisitice de Richey boa parte da aura cult que o acompanha até hoje.
Tudo começou em 15 de maio de 1991. Depois de um show no Norwich Arts Centre, a banda concedeu entrevista ao lendário crítico pop Steve Lamacq, hoje DJ da Radio 1 londrina, à época no semanário NME.
Provocando a banda, que incentivada pelo produtor Phillip Hall sempre mantinha a agressividade, Lamacq perguntou se os Manics eram ""for real" (para valer, em tradução livre). Richey não se abalou: levantou a manga da camisa e, com uma gilete, cortou até o osso a frase ""4 real" (que soa como ""for real") no antebraço.
O episódio foi incorporado à mitologia pop, mas afetou a já abalada mente de Richey -que pegou gosto pela coisa e passou a se automutilar no palco. Seu predomínio sobre a estética e as letras cresceu na mesma medida de seu alcoolismo e de suas neuroses.
Nunca foi músico. Como define um verso de ""A Prologue to History", lado B do single de ""Tolerate", ele era ""um poeta que não sabia tocar guitarra". Fingia bem, fazia pose no palco -mas, às vezes, desplugado.
O auge de sua influência se deu entre 93 e 94, quando foi gravado o seminal ""Holy Bible" e quando morreu de câncer o produtor Hall, que era o ""pai" da banda.
Richey compôs algumas das mais sombrias músicas de todos os tempos. Todos os membros da banda hoje vêem aquele momento como um pesadelo, ainda que criativamente genial. ""Não quero voltar àquilo", diz Sean Moore. Em ""4st7lb", a anorexia de Richey virou poesia crua: ""Quero andar na neve e não deixar pegadas". As referência políticas e literárias tornavam as letras incompreensíveis.
Uma turnê autodestrutiva selou o destino de Richey. Os membros da banda, impotentes frente à decrepitude de Richey, se contaminaram pelo estado de espírito -James bebia sem parar, Nicky acentuou sua mania compulsiva.
No começo de 1995, quando iam levar ""Holy Bible" para os EUA, veio o fim. Pouco antes do começo da turnê, ainda no Reino Unido, Richey desapareceu. A polícia britânica achou o carro de Richey perto de Severn Bridge, uma ponte famosa pela assiduidade com que os suicidas a procuram.
Até hoje não há sinal de Richey. ""Se tivéssemos um corpo, seria tudo mais fácil", admitiu Nicky. Mas não. Pelo contrário, começaram a proliferar relatos de aparições à la Elvis. As mais recentes, em bares de uma ilhota nas Canárias.
""Sempre que as aparições são noticiadas, ficamos muito, muito ansiosos. É chato", conta Moore.
Mesmo morto (ou sumido), Richey continua a ser parte do Manics. Em ""Everything Must Go", o primeiro disco após seu desaparecimento, há cinco letras suas.
Em ""This Is My Truth" a ausência de sua poesia é substituída por referências. Em ""You're Tender and You're Tired", James canta sobre o direito que Richey tinha de apenas ""se deixar levar e morrer". ""Nobody Loved You", por sua vez, fala sobre as tentativas dos amigos de evitar a autodestruição do falso guitarrista. E Nicky avisou, em entrevista recente, que tem mais 14 músicas sobre o colega prontas. Haja lenço. (IG)


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