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"CARMEM"
Inspirado por Beethoven, Godard idealiza criação cinematográfica
CRÍTICO DA FOLHA
O que vem antes do nome e antes mesmo do prenome?,
pergunta-se a Carmem de Godard. O que veio antes da linguagem?, pergunta-nos o Godard de "Carmem". O mundo dos primeiros sons, nos responde o seu filme. "Mundo sem conceito e sem nome", de onde nos fala a poesia
de Hölderling, referência primeira de "Carmem". Para o poeta alemão, lugar do "Sagrado".
É pelos primeiros sons que o filme começa: o silêncio, o barulho
do mar, das gaivotas. O próprio
Godard surge então em cena, extraindo todos os ruídos possíveis
dos objetos de um quarto de hospital. "É preciso fechar os olhos
em vez de abri-los", diz ele, o tio
Jean(-Luc), a Carmem, a sobrinha
predileta que o visita. A Carmem
de Godard vem, obviamente, da
ópera de Bizet, mas como Godard
não gosto do óbvio, ele a usa apenas para ilustrar os movimentos
dos quartetos de Beethoven.
Partindo do mundo dos primeiros sons para chegar aos últimos
quartetos de Beethoven, Godard
(mais do que nunca aqui: God +
Art) tenta expressar o duplo sentido, duplamente inexprimível, da
palavra Criação. Quer conceber
um filme cujo processo seja como
o da criação de uma idéia musical
-sua inspiração são os cadernos
de notas de Beethoven. A música
clássica sempre representou um
mundo ideal, de pureza e homogeneidade absolutas que, em seus
filmes, é confrontado com a impureza do mundo moderno.
"Carmem" pode não ser um dos
maiores de Godard, mas é decerto
um dos que melhor evidenciam
essa confrontação. Tanto como
cineasta quanto como personagem, o Godard de "Carmem"
idealiza o processo de criação musical, mas se contenta com o caos
de uma filmagem. Em cena, faz
seu papel predileto, o de vítima do
sistema, só para não nos esquecermos de que, antes do nome e
do prenome, vem o mito Godard.
(TIAGO MATA MACHADO)
Carmem
Prénom Carmem
Produção: França, 1984
Direção: Jean-Luc Godard
Com: Maruschka Detmers, Jacques
Bonnaffé, Myriem Roussel
Quando: a partir de hoje no Top Cine
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