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LITERATURA
Escritores brasileiros que vão a Parati não aderem a acusações de romancista, que desistiu de participar de evento
Autores criticam oposição de Ubaldo à Flip
CASSIANO ELEK MACHADO
DA REPORTAGEM LOCAL
A desistência de João Ubaldo
Ribeiro de participar da Festa Literária Internacional de Parati
chacoalhou a comunidade literária brasileira, mas não teve muito
eco entre seus pares.
O romancista de "Viva o Povo
Brasileiro" teve sua "baixa" anunciada em nota do jornal "O Globo", com o qual colabora semanalmente, na quarta-feira. "Inferi,
pela divulgação, que se trata, basicamente, de realização voltada
para autores da Companhia das
Letras", declarou o escritor, editado pela Nova Fronteira.
Até a manhã de ontem, o romancista não havia tido nenhuma
"adesão" entre os demais 37 escritores escalados para o evento, que
começa no dia 7 de julho, no litoral do Rio de Janeiro.
A Folha ouviu oito escritores
que vão participar da Flip, que
manifestaram, de modo geral,
respeito pela decisão do romancista baiano, mas discordam de
suas críticas ao evento.
Em entrevista à Folha, anteontem, Ubaldo disse que preferia ficar em casa a "ser explorado como parte de um cenário composto para os autores publicados por
uma editora", disse sobre a Companhia das Letras (que não quis se
pronunciar sobre o tema), e criticou mais uma vez a divulgação.
"Não acredito que todos os redatores do Rio encarregados de
editar matérias sobre a Flip tenham dito: "Ó, Deus meu, o nome
de João Ubaldo está aqui, vou telefonar ao meu editor". O editor
ouvindo isso diria: "Tire o nome
desse idiota da relação". Não acredito nessa hipótese."
"Sou um escritor que já transcendi o nível do etc. e não atingi
nem esse nível na divulgação",
disse, citando reportagens do
próprio "O Globo" e da "Veja
Rio" que não haviam citado ou
dado nenhum destaque para ele.
A assessora de imprensa do
evento, Selma Caetano, diz: "Demos a mesma importância a todos os autores, todos eles citados
em qualquer material produzido
por nós. Ubaldo está me dando
um poder que eu não tenho".
Sérgio Sant'Anna, considerado
um dos principais contistas do
país, diz que "Ubaldo deve ter as
razões dele", mas defende que a
questão da divulgação é o que menos importa. "Nem estou olhando se estou sendo citado ou não.
Importante é que o festival é extremamente positivo para a literatura brasileira."
Lygia Fagundes Telles, que teria
a companhia de Ubaldo (e de
Moacyr Scliar) na mesa "Os Clássicos dos Clássicos", fala no mesmo tom. "Ele tem toda a liberdade
de agir como o coração ou a razão
dele determinam, mas nós, autores brasileiros, omitidos por natureza, deveríamos dar as mãos."
Citando o crítico de cinema e escritor Paulo Emílio Salles Gomes
(1916-77), com quem foi casada,
disse: "Como todas as coisas do
mundo (coisas importantes e menos importantes) é muito bom o
encontro com outra gente, porque acontece, às vezes, que nesses
encontros alguém de repente pode encontrar a si mesmo".
Lygia e Verissimo, autor que
substitui Ubaldo no evento dedicado a "clássicos brasileiros", foram os autores citados por um
dos "caçulas" do evento, Marcelino Freire, publicado pela Ateliê
Editorial, para discutir a divulgação da Flip.
"É evidente que os autores de
fora, que nunca estiveram no país,
vão receber mais destaque no primeiro momento. Verissimo e
Lygia, e o próprio Ubaldo, têm espaço o ano inteiro. Seria a mesma
coisa se Ubaldo fosse a um festival
na Inglaterra", diz. Trocadilhista
contumaz, ele lamenta, porém, a
ausência do escritor: "Ele jogou
um "ubaldo" de água fria na minha
expectativa de contar com a pimenta dele em meu acarajé".
A falta da "pimenta" ubaldiana
também foi lamentada por autores como Luiz Vilela, Moacyr
Scliar e, com algum humor, por
Joca Reiners Terron.
Escritor e editor da pequena
Ciência do Acidente, assim como
Freire presente no ano passado
em Parati como "flipenetra" e
agora na programação oficial do
evento, ele diz: "Com essa história
Ubaldo reinventa a tradição baiana de João Gilberto, ainda que
Caetano seria a figura mais adequada para debandar da festa. Por
outro lado acho que assim o ziriguidum literário fica mais equilibrado, entre imortais, leitores e
pára-quedistas letais, feito eu".
Entre os defensores de Ubaldo,
o maior entusiasmo partiu de fora
da comunidade de escritores: de
uma livraria.
Depois de saber há alguns dias
que não seria parceira da Flip, como no ano passado, a dona das
únicas duas livrarias da cidade,
Norma Reis, decidiu criticar o
evento homenageando Ubaldo.
"Vou colocar uma faixa em desagravo a ele e expor todos os seus
livros com destaque", disse a proprietária da Nova Parati, que perdeu o título de "livraria oficial"
para a paulistana Livraria da Vila,
que levará equipe de São Paulo.
Informado disso pela Folha,
Ubaldo solidarizou-se com a livreira. "Em um país com mais
editoras do que livrarias, esse estabelecimento é mantido há anos
heroicamente por essa senhora. E
na única ocasião no ano em que
ela poderia faturar alguma coisa
eles montaram lá outra livraria",
ponderou Ubaldo.
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